Salehi, o chanceler gente fina
23/07/12 15:00
Ele obteve diplomas em algumas das melhores universidades do mundo, fala inglês perfeito, atende a todos com elegante simpatia e tem modos pra lá de sofisticados. O ministro das Relações Exteriores Ali Akbar Salehi, 63, é unanimemente considerado um dos melhores _e mais moderados_ quadros do governo iraniano.
Os embaixadores estrangeiros em Teerã adoraram quando o presidente Ahmadinejad demitiu no final de 2010 o então chanceler Manouchehr Mottaki, de estilo truculento e inglês mediano, e entregou a pasta a Salehi. De repente, os diplomatas gringos passaram a tratar com um homem refinado e capaz de entender as preocupações e anseios de governos que não pensam como o seu. É comum ouvir embaixadores ocidentais se derramarem em elogios ao ministro.
Um dos trunfos de Salehi é sua dupla trajetória de acadêmico e diplomata.
Filho de um rico empresário, ele nasceu no santuário xiita de Karbala, no Iraque, onde sua família tinha negócios. Começou sua andança pelo mundo ao terminar o segundo grau. Foi primeiro ao Líbano, até então epicentro da vida cultural e acadêmica no Oriente Médio. Graduou-se em engenharia mecânica pela Universidade Americana de Beirute, após passar anos imerso no ambiente cosmopolita da capital libanesa. Em seguida foi fazer doutorado em física nuclear no Massachussets Institute of Technology, o famoso MIT americano. Conseguiu o diploma em 1977 e voltou ao Irã para lecionar. Suas credenciais científicas lhe permitiram integrar o Centro Internacional de Física Teórica, um prestigiado órgão sediado na Itália e chancelado pela Unesco.
Após a Revolução Islâmica de 1979, Salehi passou parte dos anos 80 e o início dos 90 como reitor da Universidade Sharif de Teerã, que ele ajudou a transformar numa das melhores escolas de engenharia do mundo nas palavras de Burton Richter, da Universidade Stanford. “Sem sombra de dúvida, a melhor universidade do mundo em termos de graduação em engenharia é a Universidade Sharif de Teerã (…). Os estudantes aqui são impressionantes”, disse Richter ao visitar o Irã em 2007.
Mas foi no período em que Salehi chefiou a universidade que ele teria supervisionado a aquisição de material nuclear ilegal pelo regime, segundo o think-thank americano Instituto para a Ciência e Segurança Internacional (ISIS, na sigla em inglês).
Aos olhos dos detratores, pesa contra Salehi o fato de ele ter passado os últimos 15 anos como um dos figurões do programa nuclear _que o Irã diz ser voltado apenas para fins energéticos e medicinais. Em 1997, o governo reformista de Mohammad Khatami o escolheu para ser embaixador na agência nuclear da ONU, a AIEA, sediada en Viena. Salehi manteve-se no cargo mesmo após a chegada ao poder do conservador Ahmadinejad em 2005. Foi nesse período que ele conquistou de vez o respeito dos círculos diplomáticos ocidentais. Há quatro anos Salehi assumiu a Agência de Energia Atômica do Irã, onde ficou até tornar-se chanceler, função intimamente ligada à defesa do enriquecimento de urânio.
Hoje Salehi atua como espécie de porta-voz dos partidários da conciliação dentro do regime. Há quem diga que é ele o responsável por convencer Ahmadinejad a reduzir sua retórica incendiária contra Israel e o Ocidente. E nos últimos dois anos, período em que conflitos e problemas internos obrigaram o presidente a se concentrar em temas domésticos, Salehi vem conduzindo uma política externa sensata e cautelosa, embora limitada pelos humores do líder supremo, comandante absoluto do regime. É evidente que a relação do Irã com os vizinhos árabes, a Turquia e o Ocidente não vai bem, mas tudo indica que a coisa seria muito pior sem Salehi.
Quando estudantes prórregime invadiram a Embaixada do Reino Unido em Teerã, em dezembro, foi Salehi quem criticou e lamentou a ação e prometeu que incidentes deste tipo não se reproduzirão _não houve, no entanto, pedido de desculpas. Num caso mais recente, Salehi acalmou os mercados de petróleo ao dizer que o Irã não estava prestes a fechar o estreito de Hormuz, por onda passa um quinto da produção mundial de óleo bruto. Jornalistas ocidentais em Teerã enxergam Salehi, um pai de família de fala mansa e gestos suaves, como a melhor fonte do governo para entrevistas.
A classe refinada de Salehi representa também uma fraqueza. Sem o fervor ideológico e a lealdade irrestrita ao regime ostentados por outros dirigentes, o chanceler dificilmente poderá aspirar a voos mais altos.