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Samy Adghirni

Um brasileiro no Irã

Perfil Samy Adghirni correspondente em Teerã.

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Pegue uma senha quem quiser presidir o Irã

Por Samy Adghirni
14/05/13 13:52

A corrida para presidir a República Islâmica do Irã começou num abafado salão no subsolo do Ministério do Interior, no coração de Teerã. É lá que as autoridades coordenaram durante cinco dias (de 7 a 11 de maio) as inscrições dos candidatos para o pleito de 14 de junho. Pela lei, qualquer cidadão pode concorrer, desde que seja iraniano nato, muçulmano xiita, tenha ao menos 40 anos de idade, pós-graduação e ficha policial limpa. Mas como essa filtragem só é feita na etapa seguinte, na qual as candidaturas passam pelo crivo das instâncias legais e ideológicas do regime, qualquer um tem direito de se inscrever.

O primeiro passo para se registrar era pegar uma senha numa máquina eletrônica situada logo na entrada do salão. A pessoa, então, esperava a vez de olho numa televisão onde eram anunciados os números chamados. Como cortesia, garçons do ministério distribuíam chá e biscoitos a quem estava na fila. Uma vez chamados, os aspirantes se viam encaminhados até uma das mesas de inscrição, onde eram recebidos por atendentes. A formalidade consistia em preencher uma ficha, apresentar documento de identidade, currículo e 12 (!) fotos 3 x 4. A regra vale para todos. Um ex-ministro teve de voltar para casa porque havia esquecido de trazer seu RG.

A esmagadora maioria dos que apareceram eram desconhecidos, cidadãos comuns atraídos pela possibilidade de participar de um jogo –em tese– aberto a todos, refletindo ideais populares e democráticos vendidos pela revolução islâmica contra a ditadura do xá, em 1979. Teve presidenciável de tudo quanto é tipo: maluco beleza, aposentado, clérigo de médio escalão, doidão enrolado na bandeira do Irã, vereador vindo dos confins do país e até uma jovem bonitona que enlouqueceu fotógrafos e cinegrafistas de imprensa.

Um dos candidatos com quem conversei naquele circo é Ali Rahimi, 59, cirurgião com dupla cidadania iraniana-americana que dizia portar também um passaporte alemão. Rahimi era o único sujeito de gravata, acessório execrado pelo aiatolá Khomeini, fundador da república islâmica, que o tinha como símbolo da dominação ocidental. “Eu posso ajudar a consertar a relação entre Irã e EUA. A tensão atual não beneficia ninguém”, explicou.

Os mais sortudos entre os anônimos ganhavam direito de discursar diante da imprensa num auditório situado ao lado do salão. Mas, quase sempre, a fala era feita diante de um punhado de repórteres sonolentos e desinteressados. O que a mídia esperava mesmo eram os pronunciamentos dos candidatos “de verdade”, cuja chegada rompia com a monotonia do processo. Toda vez que aparecia algum figurão, jornalistas e seguranças se agitavam e se apertavam para acompanhar a formalidade eleitoral e, em seguida, o discurso no anfiteatro. Obviamente, os poderosos dispensavam a senha para entrar na fila das inscrições.

Foi assim que eu pude ver de pertinho muitos dos homens mais poderosos e influentes do país. Assessor especial e homem da máxima confiança do líder supremo aiatolá Ali Khamenei, o ex-chanceler Ali Akbar Velayati, um velhinho alto e elegante, distribuiu aos jornalistas uma cópia do seu discurso, no qual admitia impliciatmente a necessidade de o Irã moderar seu tom na relação com o mundo. Questionado por uma repórter chinesa sobre como lidaria com os EUA caso virasse presidente, Velayati, médico de carreira formado na Universidade americana John Hopkins, respondeu num inglês fluente. “Já viajei muito, e conheço os temas internacionais. [Melhorar a relação com os americanos] não é impossível”.

Também vi Hasan Rowhani, um reformista de turbante conhecido e respeitado pelas chancelarias ocidentais por ter sido o negociador nuclear chefe do Irã no período que antecedeu a era Ahmadinejad, tempos bem menos tensos. O atual negociador atômico, o conservador Said Jalili, também se inscreveu enquanto eu estava lá. Com seu jeito caladão e sorrisinho enigmático, entendi porque Jalili não consegue atrair a simpatia dos seus interlocutores no dossiê nuclear. Europeus, principalmente, queixam-se da total “falta de química” nas conversas com o iraniano. Manouchehr Mottaki, que era chanceler do Irã na época da lua de mel com o Brasil e já esteve várias vezes em Brasília, não chamou muito a atenção quando preencheu a ficha de inscrição. Na verdade, entre os candidatos com real chance de ganhar, só perdi a apresentação do prefeito de Teerã, Mohamad Qalibaf, sujeito sério e com alto índice de aprovação –conheço uma jornalista iraniana que cultiva em segredo uma paixão por ele.

O auge desse espetáculo todo ocorreu aos 40 do segundo do tempo. Literalmente. Faltavam cinco minutos antes do fim do prazo para as inscrições, no sábado passado, quando surgiram os personagens centrais da eleição. Encerrando meses de suspense, o ex-presidente centrista Ali Akbar Hashemi Rafsanjani (1989-1997) fez uma entrada triunfal no ministério, sendo recebido com gritos e até choro de colegas jornalistas críticos do atual governo (no Irã, jornalismo tende a ser uma atividade partidária, e as pessoas muitas vezes não entendem quando digo que não sou a favor nem contra). Com a disputa esvaziada de reformistas importantes, Rafsanjani parece ser o homem capaz de dar esperança a milhões de pessoas na classe média urbana, até então alheias à eleição deste ano. Sendo um dos empresários mais ricos do país, tem a simpatia do mundo dos negócios. Com formação clerical e sendo ele mesmo aiatolá, também é capaz de atrair votos conservadores. Sua entrada eletrizou uma campanha até então para lá de morna. Fiquei arrepiado com o extase de intensidade causado pela sua chegada ao ministério.

 

O mais incrível é que quando Rafsanjani e a multidão que o cercava, eu lá no meio, desceram as escadas até a sala das inscrições, lá estavam ninguém menos que Mahmoud Ahmadinejad e seu fiel chefe de gabinete, Esfandiar Rahim Mashaee, que haviam entrado no prédio por outra entrada. Sem poder concorrer novamente devido à limitação de dois mandatos seguidos, Ahmadinejad tenta emplacar Mashaee, contrariando até mesmo o líder supremo, que acusa o clã presidencial de querer minar as fundações religiosas do Estado para favorecer uma ideologia persa nacionalista. A presença simultânea das duas delegações incendiou o ambiente, dominado por empurra empurra, gritos de apoio e flashes de fotógrafo.

Terminadas as inscrições, as candidaturas neste exato momento estão sendo avaliados pelo Conselho de Guardiães da Revolução, formado po seis juristas e seis clérigos, responsável por avaliar as credenciais revolucionárias e o cacife dos candidatos. Do total de 686 inscritos, especula-se que uma dúzia, no máximo, esteja qualificada para o pleito. Os nomes serão anunciados na próxima semana. De todos os figurões citados nesta matéria, o único com chance real de ser barrado é Mashaee, em represália ao fato de ele e Ahmadinejad terem passado boa parte dos últimos anos questionando a supremacia do líder supremo e dos religiosos.

Já imagino alguns leitores questionando a pertinência das eleições num país como o Irã. Pois bem, vale lembrar que o sistema iraniano, em sua concepção original, pretende mesclar princípios do Iluminismo (república) e da religião (islâmica). O modelo prega, em tese, características democráticas, como representantes eleitos pelo povo, pluralidade social e direitos a minorias religiosas, tudo isso sob a benção de uma autoridade munida de poder divino para dar a palavra final sobre grandes questões nacionais. Isso, claro, é a teoria.

Mas, para além da discussão sobre violação de direitos humanos e perseguição, é preciso ter em mente que praticamente todas as eleições presidenciais iranianas até 2009 foram amplamente consideradas justas e limpas. O povo ia às urnas, e o candidato mais votado ganhava. Foi assim até mesmo quando o vencedor não era a opção preferida do líder supremo, como em 1997, quando o reformista Mohammad Khatami obteve esmagadora maioria dos votos. Khatami acabou reeleito quatro anos depois, contrariando novamente a vontade do líder. O regime contornava bem a contrariedade e ostentava o resultado das urnas e o ambiente de relativa liberdade (de imprensa, de opinião) no país como supostas provas de sua legitimidade democrática. Mas 2009 foi um divisor de águas. O povo foi às ruas dizendo que a reeleição de Ahmadinejad resultava de fraudes, e os protestos acabaram silenciados com violência. O regime perdeu milhões de simpatizantes com a guinada repressiva pós-pleito.

Em 2013, mais do que nunca, o Estado quer e necessita se relegitimar. Para tanto, precisa de uma campanha empolgante, de uma votação em massa e de um resultado com pouca margem para contestação. Tudo está ainda indefinido e sujeito a alianças e reviravoltas de última hora. As próxima semanas prometem.

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A loira sensual a serviço da TV estatal do Irã

Por Samy Adghirni
07/05/13 16:04

Ela é uma ex-modelo ocidental jovem e bonita, que já exibiu o corpão em revistas masculinas e adora tomar todas durante festas cheia de glamour. Nada disso seria problema se não fosse pelo novo emprego da moça. Edwina Grace Storie, australiana de 25 anos, foi contratada como correspondente em Sydney pela Press TV, o canal internacional em língua inglesa da República Islâmica do Irã. Edwina é alvo de uma enxurrada de críticas por todos os lados depois que um blog maldoso foi atrás de seu histórico e vasculhou as redes sociais até achar –e escancarar– informações pessoais que a comprometam.

No Facebook, fotos mostram Edwina na balada, em trajes sexy e ambientes com fartura de álcool. No twitter, posts deixam clara a paixão da moça por champanhe. Na internet há também fotos de Edwina sendo carregada na horizontal por homens sem camisa. O que mais chama atenção, no entanto, é a galeria online de uma agência de modelos que oferece candidatas para campanhas publicitárias e ilustrações de revistas para homens. Edwina aparece de lingerie e em poses provocantes. Tudo isso foi estampado na home do blog australiano Vexnews.

O Vexnews alega que o problema é a Press TV, não Edwina, e que ninguém deveria se envolver com a máquina de propaganda do governo iraniano. No Irã, diz o site, mulheres são oprimidas e devem andar cobertas da cabeça aos pés, álcool e festas são proibidos e autoridades violam direitos humanos. Editores do Vexnews se divertem exibindo na home uma imagem da moça deitada numa cama, com pouca roupa e cabelos soltos, ao lado de outra, em que ela aparece de hijab (véu islâmico) e ar sério, numa reportagem desde Sydney.

No Irã também houve críticas. O site Enekas disse que a contratação de uma repórter com o perfil de Edwina contradiz os ideais da Revolução Islâmica, comandada pelo aiatolá Khomeini, em 1979. “Estão zombando da Press TV”, lamenta o site, que pergunta por que razão a moça foi recrutada. “A beleza se tornou critério para contratação de repórteres? Vale a pena atrair telespectadores recorrendo a métodos usados pela mídia não islâmica, que é capaz de qualquer ação desumana para manipular a mente do público?”

A Press TV, à qual dediquei um dos primeiros textos deste blog, reagiu com indignação e defendeu sua colaboradora, que descreveu como profissional competente. A emissora contratou advogados e prometeu processar o Vexnews. Segundo a Press TV, a polêmica foi montada para retaliar reportagens nas quais a correspondente relata uma campanha de boicote a Israel nas universidades australianas. A TV iraniana divulgou um comunicado atribuído a Edwina no qual a moça diz que o blog se apoderou de fotos “tiradas há sete anos”, quando ela era “modelo ativa”. As imagens, afirma, foram comercializadas sem autorização, e ela se arrepende de ter posado para “aquelas fotos”.

O Vexnews voltou ao ataque e questionou a veracidade da fala atribuída a Edwina. O site até conseguiu uma rápida entrevista com a correspondente, na qual ela não menciona o comunicado da Press TV, mas diz estar “profundamente chocada e traumatizada” com tamanha exposição. O blog diz ter levantando a informação (presumo que junto à própria entrevistada, em off) de que Edwina não pretende mais trabalhar na Press TV, famosa no métier por pagar bem seus colaboradores estrangeiros.

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Castigo ao bandido: ser vestido de mulher

Por Samy Adghirni
29/04/13 12:42


A cena no vídeo acima é meio surreal, mas aconteceu de verdade, há duas semanas, numa cidadezinha perdida no interior do Irã. Uma picape circula por uma avenida comercial levando na caçamba um sujeito trajando um vestido vermelho enquanto é segurado por policiais com pinta de pelotão de choque. Vários carros da polícia seguem, formando um comboio que desfila diante da população local. Os homens no vídeo usam calça larga, tipo bombacha gaúcha, típica da região do Curdistão, palco do ocorrido.

O homem do vestido vermelho é um condenado de Justiça. Ele foi considerado culpado de violência doméstica e, como castigo, acabou obrigado a se vestir de mulher e a ser exibido como tal pelas ruas de Marivan, aglomeração situada perto da fronteira com o Iraque. O procurador-geral local alegou que a humilhação era necessária para “dar o exemplo”. Mas a punição foi tão chocante que, no dia seguinte, dezenas de moradoras vestidas de vermelho foram às ruas para protestar contra o que consideram uma ultrajante ofensa às mulheres, ao islã e aos curdos, minoria étnica alvo de discriminações. Várias levaram cartazes com mensagens lembrando que não é nenhum mal ser mulher e que o castigo é mais humilhante para a população feminina do que para o condenado. Segundo ONGs de direitos humanos, policiais reprimiram a manifestação a golpes de cassetete e spray de pimenta.

O protesto mudou de forma ao ganhar a solidariedade dos homens. Um iraniano chamado Massoud Fahtipour postou na internet uma foto na qual aparece vestido de mulher. Nascia assim a campanha “Homens curdos pela Igualdade [de gênero]”, que já conta quase 200 fotos de homens vestidos de mulher e 13 mil curtidas na página na rede social Facebook. Uma das muitas mensagens de apoio foi escrita por um homem chamado Ala M: “Estou feliz e honrado em me vestir de mulher e fazer humildemente parte da luta justa para expressar [meu apoio] às mulheres do meu país.” Outro, identificado como Namo Kurdistani, postou o seguinte comentário: “Devemos nos unir e condenar esta estupidez, brutalidade e desumanidade contra mulheres”.

Veja fotos dos curdos vestidos de mulher

Um conhecido jornalista curdo, Saman Rasoulpour, escreveu: “É a primeira vez no Irã que um acusado vestido de mulher é exibido na rua como forma de humilhação. É um ato sem precedente [no país]”.

A repercussão logo chegou à esfera política. Os deputados curdos no Parlamento iraniano conseguiram o apoio de colegas não curdos e formaram uma frente de 17 parlamentares que enviou protesto formal aos ministérios do Interior e da Justiça. A frente afirma que a pena aplicada em Marivan contraria os princípios mais fundamentais do islã e representa uma humilhação não só para as mulheres, mas para todos os muçulmanos.

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Ferraris e Porsches em Teerã

Por Samy Adghirni
22/04/13 16:47

A foto acima foi tirada na esquina da rua onde moro, num bairro residencial de classe média alta ao norte de Teerã. As máquinas são uma Ferrari 458 e um Porsche Cayman, carrões que valem fortunas e estão entre os sonhos de consumo mais universais que se possa imaginar.

A capital iraniana está cheia de automóveis caríssimos. Quem visita Teerã geralmente diz nunca ter visto tanto Porsche como aqui. Os modelos mais comuns são Cayenne e Panamera. Também há uma incrível quantidade de Mercedes e BMWs reluzentes e com cores algumas vezes para lá de excêntricas, como marrom claro, roxo e verde. Carros de ponta, como Maseratis e Ferraris, são mais raros, mas desfilam vez ou outra pelas ruas de Fereshteh, o equivalente do bairro paulistano Jardins em Teerã. Por causa das sanções, praticamente não há modelos americanos no Irã.

Muitas lojas espalhadas por Teerã vendem carrões. Iranianos capazes de comprar veículos deste tipo geralmente pagam de uma vez só, com cheque em bilhões de rials, a moeda local, ou até mesmo com malas de dinheiro. Em fevereiro a mídia local relatou a chegada de um navio carregando 500 Porsche tinindo de novos num porto ao sul do país. A marca alemã admitiu, há dois anos, que o Irã era seu maior mercado no Oriente Médio. Só em 2012 foram vendidas 563 unidades zero km.

Detalhe: a taxa de importação para carros de luxo no Irã é de quase 90%, ou seja que um veículo vendido normalmente por US$ 200 mil acabará custando, na prática, quase U$S 400 mil ao comprador iraniano. Isso dá 1,36 bilhão de rials na moeda local.

A abundância de supercarros, que não se restringe a Teerã, reflete várias realidades.

A primeira é que o Irã tem muita gente endinheirada. Há os velhos ricos, entre os quais as famílias tradicionais ligadas aos comércios de bazar, os mercadões das principais cidades. Existem, ainda, os empresários que gravitam na esfera do Estado, grande provedor de contratos, e os profissionais liberais bem sucedidos, médicos, advogados e consultores, entre outros. O Irã, apesar das crescentes dificuldades e do empobrecimento geral da população, ainda está com os cofres cheios graças à bonança gerada pelas exportações de petróleo e gás.

Nos últimos anos o Irã viu surgir uma nova categoria de ricos. As sanções financeiras e comerciais favoreceram o surgimento de uma economia paralela e clandestina, na qual intermediários, contrabandistas e negociantes ganham fortunas usando canais privilegiados. Não é segredo que a corrupção gangrena todos os níveis da economia iraniana. Dia desses ouvi de um jovem empresário local: “Eu não saberia ganhar dinheiro na Europa ou nos EUA. Aqui no Irã conheço os atalhos e sei como tirar proveito da situação. Tempos de crise sempre representam uma grande oportunidade de ganhar muita grana”.

A segunda realidade traduzida pela fartura de carrões é a desvalorização da moeda conjugada à inflação nas alturas, que transforma automóveis em patrimônio sustentável. Como já mencionei neste blog, muitos iranianos preferem gastar suas economias adquirindo um bem de alto valor que passa a ser uma posse segura em vez de ver a poupança derretendo no banco à medida em que a moeda nacional se desvaloriza por causa das sanções. A revista “Economist” publicou no mês passado uma matéria matéria sobre o frenesi por carrões no Irã (“Islamist Maseratis”, 16.mar.2013). Além do mais, o Irã é um lugar onde carro usado se desvaloriza pouco. Já ouvi histórias de pessoas que venderam o carro mais caro do que compraram.

Acho que nesta equação também entra a questão do culto às aparências. No Irã, como em muitos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, a ostentação material é prática comum.

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Que fim levou a Sakineh?

Por Samy Adghirni
05/04/13 11:38

Dia desses me deparei na linha do tempo do Facebook com o post de um amigo que dizia ter acordado querendo saber notícias da Sakineh Mohammadi Ashtiani, a iraniana cuja condenação à morte por apedrejamento sob acusação de ter traído e matado e marido causou comoção mundial há alguns anos. Mesmo sem ter sido solicitado, me senti compelido, na minha condição de correspondente no Irã, a compartilhar as parcas informações que se tem a respeito, já que o caso desapareceu por completo do noticiário.

Escrevi ao amigo e decidi estender a resposta, de forma mais elaborada, aos leitores deste blog.

Primeiro, uma boa notícia. Na verdade, duas. 1) Sakineh está viva. 2) A execução por apedrejamento não só foi cancelada como a lei iraniana baniu de vez essa prática de indizível barbárie, pela qual a pessoa é enterrada até o peito e leva pedradas até morrer.

A notícia não tão boa é que ela continua presa numa cadeia em Tabriz, importante cidade no noroeste do Irã. Sakineh, hoje com 45 anos, se encontra numa espécie de limbo jurídico, sem que se saiba ao certo se a sentença capital será aplicada de outra forma (enforcamento), se ela cumprirá pena de prisão ou se acabará libertada em virtude de alguma decisão política.

Sakineh Ashtiani, que foi condenada a morte por apedrejamento por adultério (Divulgação/Press TV)

Um pequeno lembrete dos fatos – ou pelo menos da narrativa mais plausível, já que o caso é extremamente confuso e cheio de relatos impossíveis de verificar.

Sakineh pertence a um meio rural enraizado no extremo oeste do Irã. É uma região pobre e montanhosa, onde predomina a etnia azeri, que é completamente distinta dos persas, majoritários no país. Os azeris falam um dialeto turco e alguns sentem-se culturalmente mais próximos da Turquia ou do Azerbaijão, dois países cujas fronteiras ficam a poucas horas de carro de Tabriz, capital regional. Pratica-se nesta área um islã tido como mais conservador do que em outras cidades iranianas como Shiraz ou Kerman.

Sakineh, mãe de um rapaz e de uma moça, era dona de casa e fazia bico de babá em jardim de infância. Em 2005, seu marido foi dopado e assassinado com descarga elétrica por um primo dele e um comparsa. A polícia prendeu os dois homens e Sakineh sob suspeita de que ela tinha um caso com os matadores. Quem teria denunciado o suposto adultério é a mulher de um colega de trabalho do marido morto. O primo supostamente assassino foi condenado à morte, mas acabou perdoado pelos filhos de Sakineh e hoje está solto.

Já Sakineh confessou ter mantido “relações ilícitas com dois homens”. Há quem diga que ela se confundiu na hora de assinar a confissão de culpa por não compreender o farsi, idioma da Justiça iraniana. O processo foi todo truncado (e falho, segundo a defesa) devido às dificuldades de tradução do dialeto azeri para o farsi. Sakineh acabou condenada a um castigo físico: 99 chibatadas. A sentença teria sido aplicada na frente do filho.

Em 2006 iniciou-se o segundo processo de Sakineh, desta vez por suspeita de envolvimento na morte do marido. Ela foi inocentada das acusações de participação direta no assassinato, mas o juiz a considerou cúmplice. Após recurso, a pena foi reduzida de 10 para cinco anos de detenção. Mas eis que, de repente, algum juiz decidiu reabrir o processo por adultério, que já estava encerrado. Após uma série de reviravoltas confusas, Sakineh foi condenada à morte por apedrejamento (pena que NÃO consta no Corão). A Suprema Corte negou recurso e, em 2007, autorizou a execução.

Desde então, ONGs, governos ocidentais e advogados conduzem uma campanha para salvá-la. A polêmica chegou ao Brasil no fim do governo Lula, época em que o movimento em defesa de Sakineh pressionava o Itamaraty a aproveitar sua até então ótima relação com o Irã para interceder em favor da condenada. Lula pediu a Teerã que a libertasse e até ofereceu asilo à mulher. O governo iraniano respondeu algo na linha: “não, obrigado, deixa que eu cuido dos meus assuntos internos”.

Mas a comoção internacional parece ter surtido algum efeito. Em 2010, o governo iraniano anunciou que Sakineh “não será morta por apedrejamento”. No ano passado, altas autoridades morais e judiciárias endossaram uma decisão anterior do Parlamento para banir o apedrejamento dos textos legais iranianos. O último apedrejamento de que se tem notícia aconteceu em 2007, segundo a agência de notícias Associated Press, cuja equipe em Teerã, formada apenas por iranianos, é geralmente bem informada.

Sobram dúvidas. O que será feito de Sakineh? Ela tem, afinal, alguma culpa no assassinato do marido? Mesmo que se tenha uma posição contrária à pena de morte, é importante saber o que realmente houve. Para além da Sakineh, o que a Justiça iraniana fará com os anônimos condenados à morte por apedrejamento, mulheres e homens, que aguardam a aplicação da sentença? A execução a pedradas foi abolida só para novos casos ou também para os antigos condenados? Acho que nem a Justiça iraniana tem essas respostas.

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Ahmadinejad e sua 'paixão' pela primavera

Por Samy Adghirni
28/03/13 13:27

Mahmoud Ahmadinejad não para de falar na primavera. Em qualquer discurso ou resposta, o presidente dá um jeito de fazer alguma alusão à estação. Primavera lá, primavera cá. Primavera isso, primavera aquilo.

Começou em setembro, em Nova York, quando ele encerrou seu discurso anual na Assembleia Geral da ONU dizendo: “Viva a primavera! Viva a primavera! Viva a primavera!” _”zendê bad bahár”, no idioma farsi. No mês seguinte, Ahmadinejad deu uma longa entrevista coletiva em Teerã, na qual falou sentado numa mesa coberta por jasmin e à frente de um painel mostrando flores escancaradamente abertas sobre verdejante grama para simbolizar a estação. No aniversário da revolução islâmica, em fevereiro, seu discurso foi encerrado com a mesma frase usada na ONU.

A coisa se intensificou nos últimos dias, por conta da chegada de fato da primavera, no dia 21 de março, que coincide com o Nowruz, o Ano Novo persa, festejado no Irã e alguns outros países da região. Pouco antes da virada, o presidente saía de uma reunião de gabinete sobre economia quando um repórter lhe perguntou se havia alguma novidade para a população. A resposta: “Pode haver notícia melhor e mais bonita do que ver a primavera chegando? O tempo do sofrimento se vai e, se Deus quiser, o próximo ano será bom e proveitoso para todos os iranianos”.

O tradicional pronunciamento do presidente à nação por conta do ano novo foi gravado ao ar livre, num cenário campestre cheio de árvores, como que para martelar de todas as maneiras possíveis a beleza da nova estação. À voz de Ahmadinejad se somava o alegre canto de passarinhos na volta. A maior parte do discurso de quase uma hora foi dedicada à primavera. O presidente disse que o Irã e o mundo atravessaram um longo e sofrido inverno, mas agora regozijam-se com a chegada da temporada mais florida. Sorridente e calmo, também falou que a primavera é uma benção imparável, uma onda irreversível de alegria que espalhará paz e prosperidade pelo mundo inteiro. Como todos já esperavam, o discurso terminou com “zendê bad bahár”, repetido umas quantas vezes, como se o presidente estivesse declamando um poema.

Mas, afinal, o que está por trás dessa tara pela primavera?

Trata-se, evidentemente, de uma mensagem política. Mais do que isso, “zendê bad bahár” é um arrojado posicionamento estratégico e eleitoreiro, pois a expressão passou a ser nada menos que o slogan informal de campanha do clã presidencial na tensa campanha para a eleição de 14 de junho.

Por conta da lei que impede três mandatos consecutivos, Ahmadinejad não pode concorrer. Mas ele está jogando pesado para emplacar seu chefe de gabinete e amigo íntimo, Esfandiar Rahim Mashaee, cuja filha é casada com um dos filhos do presidente. O problema é que Mashaee é detestado pela elite do establishment militar e religioso aliada ao líder supremo, aiatolá Ali Khamenei.

A turma que controla o topo do Estado, muito mais poderosa que a Presidência, enxerga Mashaee e o próprio Ahmadinejad como personagens excêntricos demais e insubmissos à ideologia da república islâmica. A acusação faz algum sentido. Os dois contestaram várias vezes decisões do líder supremo e defendem uma agenda muito mais ligada às raízes nacionalistas da Pérsia antiga do que ao islã, surgido entre povos árabes rivais dos persas.

Apesar da péssima imagem no Ocidente, Ahmadinejad é hoje o único alto funcionário do governo iraniano a querer afrouxar as leis morais, principalmente em relação às mulheres. O presidente também prega conversas diretas com os EUA para pôr fim ao impasse nuclear. Já Mashaee declarou numa entrevista há alguns anos que o Irã é amigo de todos os povos do mundo, inclusive dos israelenses. Por essas e outras, o líder supremo, que apoiara a contestada reeleição de Ahmadinejad em 2009, hoje enxerga o presidente como ameaça potencial às fundações do regime.

Diante disso, a cúpula do regime gostaria que o órgão eleitoral encarregado de avaliar as credenciais ideológicas dos presidenciáveis vetasse a candidatura de Mashaee. O problema é que Ahmadinejad já deixou claro que irá criar graves problemas se Mashaee for impedido de concorrer. O presidente ameaça revelar segredos para lá de comprometedores para o Estado, possivelmente envolvendo a eleição de 2009.

Para evitar um escândalo em plena campanha, o líder supremo insinuou em seu discurso de ano novo que talvez Mashaee seja autorizado a concorrer (os candidatos aprovados pelo órgão eleitoral serão conhecidos no ínicio de maio).

O clã do presidente proveu tantos subsídios e programas sociais que alguns bons milhões de votos podem ser dados como certos. Especula-se que Mashaee queira alcançar não somente os mais pobres mas também a classe média urbana e pouco religiosa. Já pensou se ele concorre e ganha, contrariando seus inimigos poderosos? É assunto para ser debatido mais perto da eleição.

A temática da primavera, portanto, é uma manobra subversiva, uma espécie de abre-alas politico-filosófico que remete à chegada de uma era de renovação, o que alguns enxergam como uma contestação velada do sistema em vigor. Muita gente também traça um paralelo com as primaveras árabes, que vêm derrubando a velha ordem para levar ao poder novas maneiras de governar. A eleição acontecerá na reta final da primavera.

O clã do presidente se apropriou a primavera de tal maneira que a TV estatal, ligada ao escritório do líder supremo, está proibida de usar a palavra, que também sumiu da maior parte das agências de notícias oficiais. O prefeito de Teerã, conhecido pelas ambições presidenciais, baniu da cidade todos os outdoors de boas vindas à nova estação. O deputado linha dura Mohammad Hassan Asafari disse que “Viva a primavera!” não passa de uma expressão de “desviados”, termo usado para se referir a quem contesta o governo islâmico.

Ahmadinejad dá de ombros e promete ir até o fim com seu projeto primavera. Custe o que custar.

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John Kerry e seu genro iraniano

Por Folha
22/03/13 21:57

Mergulhados na celebração do Nowruz, o ano novo persa festejado na última quarta-feira, os iranianos receberam mais uma vez os parabéns oficiais do governo americano, que tenta mostrar não ter nada contra a população da república islâmica. Repetindo o que fez várias vezes desde sua chegada à Casa Branca, em 2009, Barack Obama divulgou um vídeo cheio de acenos apaziguadores. Ele destacou a importância do Irã na história da civilização mundial, citou o grande poeta persa Hafez e encerrou a gravação com um “feliz ano ano” pronunciado no idioma farsi: “Eid shomá mobarak”.

O recém-empossado secretário de Estado John Kerry foi ainda mais enfático na sua mensagem. O chefe da diplomacia dos EUA desejou “saúde e prosperidade” aos iranianos e, pela primeira vez, fez menção oficial ao seu genro, um médico iraniano radicado nos EUA, onde adquiriu cidadania local. “Tenho orgulho dos iranianos-americanos na minha própria família e sou grato por terem enriquecido minha vida”, disse Kerry, que escapou por pouco de ter a nomeação vetada pelo Congresso justamente por ser visto como suave demais com o Irã.

O genro de Kerry chama-se Behrooz Vala Nahed, tem 30 e poucos anos e é um respeitado neurocirurgião formado em Yale e especializado em câncer do cérebro, atualmente em seu quinto de ano de residência pela Universidade Harvard no hospital geral de Massachussets, em Boston. Filho de abastados pais iranianos instalados em Los Angeles, Behrooz é casado com Vanessa Bradford Kerry, cuja mãe foi a primeira mulher de John Kerry. Vanessa tem 35 anos e também é médica. A história de seu encontro, se for mesmo conforme o relatado por sites americanos, é engraçadinha.

Numa madrugada de 2005, Behrooz e Vanessa faziam plantão juntos no hospital geral de Massachussets. Os dois, que já haviam reparado um no outro nos corredores do hospital, aproveitavam uma pausa para bater o primeiro papo. Conversa vai, conversa vem, uma enfermeira bonitona entra na sala e, cheia de graça, interrompe o papo dos jovens médicos para oferecer um café ao rapaz. Vanessa não gostou. “Olhei para ele com cara de: ‘já saquei qual é a sua’”, relatou anos depois. Mas o iraniano soube contornar com maestria o avanço da enfermeira. Para deixar claro quem era sua prioridade, ele agradeceu o cafezinho da moça e sugeriu que ela trouxesse outro para Vanessa. Dois meses depois, começava o namoro, que virou casamento em 2009. Há relatos de que o paizão Kerry, à época senador democrata e riquíssimo empresário, fez questão de participar de cada detalhe dos preparativos.

Behrooz e Vanessa parecem levar uma vida tranquila, longe de qualquer posicionamento político público. A agência de notícias iraniana Mehr, ligada ao regime, especula que o casal pode ter visitado a família de Behrooz no Irã alguns anos atrás.

Os adversários políticos de John Kerry dizem que o genro iraniano contribui para afrouxar a sua posição em relação ao governo dos aiatolás e lembram que o democrata, quando senador, ofereceu-se para ir à república islâmica como abre-alas de uma eventual reaproximação entre Washington e Teerã, rompidos há três décadas. Acho difícil uma questão familiar influenciar uma posição de Estado, principalmente quando se trata da Casa Branca. Mas é verdade que Kerry defende uma abordagem muito mais serena e pragmática do que a média dos políticos americanos para lidar com o Irã.

No fundo, esse caso vai além da simples discussão geopolítica. Behrooz é parte da importante comunidade iraniana-americana, avaliada em ao menos 2 milhões de pessoas. É tanta gente que, por ironia do destino, uma das maiores delegações iranianas no exterior encontra-se nos EUA, país com quem Teerã oficialmente não tem relação formal. Questões consulares, legais e de cartório são tratadas na seção de interesses iranianos abrigada pela Embaixada do Paquistão em Washington. Teerã faz questão de manter vínculo com a diaspora, apesar de muitos iranianos dissidentes não se sentirem seguros para voltar ao seu país.

Iranianos vêm migrando para os EUA desde o início do século 20, mas a tendência acentuou-se após a Revolução Islâmica no Irã, em 1979. Aos olhos de muita gente, trata-se de uma comunidade discreta e bem integrada. Há abundantes histórias de sucesso, desde anônimos que fizeram fortuna até grandes cientistas, intelectuais e artistas. O Conselho Nacional Iraniano-Americano (NIAC, na sigla em inglês) é um dos principais lobbies em defesa de uma diplomacia americana que enxergue além das sanções e ameaças. Mas de tão arredio devido à desconfiança acumulada, o Irã costuma não responder aos acenos americanos.

PS: Pelo calendário persa, começa agora o ano de 1392. Esta maneira de contar os anos existe no Irã e em algumas comunidades persas no Afeganistão e Turcomenistão, entre outros países. O Irã tem população e governo islâmicos mas não segue o calendário muçulmano tradicional (atualmente em 1434). O ponto de partida é o mesmo: o ano de 622 D.C, quando o profeta Maomé migra da Meca para Medina. Mas os persas adotaram em seguida um calendário solar, enquanto os árabes mantiveram e espalharam ao longo dos avanços islâmicos na Ásia e na África uma contagem lunar, com anos mais curtos. Isso explica a discrepância nas contas.

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Contra a crise, iranianos aumentam gastos

Por gmanzini
14/03/13 17:10

Um misto de sanções e má gestão do governo deixou a economia iraniana em situação pra lá de adversa, como já mencionei reiteradas vezes neste blog. A renda com as vendas do petróleo caiu pela metade. Para piorar, o Irã agora recebe a maior parte do valor das exportações em carregamentos de arroz, soja e muamba, em vez de dólares e euros.

O rial, moeda iraniana, perdeu metade do seu valor nos últimos seis meses. A taxa oficial de inflação é de 27%, mas ninguém duvida que o índice real é ainda mais alto. O poder de compra está em queda livre. O desemprego está próximo dos 12%, dado também contestável já que o governo insiste em considerar empregado quem trabalha algumas horas por semana.

Mas a reação de parte da população a esse cenário é um tanto curiosa. Em vez de apertar o cinto e cortar gastos, como é de praxe ao redor do mundo, muitos iranianos estão torrando dinheiro. O mercado imobiliário continua aquecido, e junto com ele o dos disputadíssimos outdoors publicitários nas principais avenidas de Teerã. Restaurantes vivem cheios, dos mais simples aos mais caros. Um carregamento com 500 Porsche tinindo de novos chegou há algumas semanas num porto ao sul do país. Muita gente ainda vai ao shopping Paytakht, no norte de Teerã, para comprar iPhones 5 e iPads. Nenhum sinal de penúria ou esfriamento em mercados e supermercados. Dia desses um dos vendedores de tapete persa no famoso bazar da capital me mostrou, todo sorriso, cheques recém assinados por clientes. Alguns valiam milhares de dólares. “Continuo vendendo muitos tapetes”, regozija-se o rapaz.

A explicação para esse fenômeno é a seguinte.

Os iranianos perceberam que nem no banco seu dinheiro está protegido contra a desvalorização. A cada ano, o valor absoluto das poupanças derrete um pouco mais. Diante desse cenário, uns optam por converter seu dinheiro em moeda “dura” (dólar, euro e libra esterlina) que fica guardado em casa, debaixo do colchão. Outros resolvem simplesmente gastar, investindo em patrimônio (apartamentos, comércios etc) à espera de dias mais estáveis ou antecipando planos de adquirir bens de consumo cujo preço está sempre aumentando. É possível que tudo isso não passe de uma bolha fadada à explosão, com a população gastando mais do que arrecada. Mas no curto prazo essa dinâmica está mantendo viva a economia do país.

A verdade por trás disso é que as sanções comerciais e financeiras impostas ao Irã por seu programa nuclear, apesar de dificultarem a vida de muita gente e de impedirem o regime de continuar faturando alto com petróleo, continuam a anos luz de atingir a meta declarada de forçar Teerã a curvar-se às exigências do Ocidente. A resiliência tem várias explicações.

Primeiro, o Irã é um país grande (17º maior território), populoso (75 milhões de habitantes) e com um grande setor industrial e agrícola para atender o vasto mercado interno. Ou seja que a economia vai muito além do petróleo e o país não depende tanto de importações.

Segundo, Teerã ganhou tanto dinheiro antes das sanções mais pesadas, adotadas em 2012, que os cofres do governo continuam abarrotados de moeda estrangeira. Avaliações conservadoras dizem que o país tem ao menos US$ 70 bilhões em cash estocado.

Terceiro, o Irã também é o país do jeitinho. Há relatos de que Teerã está pagando fortunas a consultores e auditores gringos capazes de ajudar a contornar as sanções. O petróleo iraniano sempre encontrará comprador, e as vendas sempre trarão algum dinheirinho.

Dito tudo isso, muita gente séria afirma que essa safra de sanções barra pesada é muito recente e ainda não começou a surtir efeito de verdade. Partidários desta tese dizem que, cedo ou tarde, Teerã ficará numa situação difícil, de estrangulamento, que levará o governo iraniano a um dilema existencial: dobrar-se aos inimigos para sobreviver, pesadelo de todos os regime ideológicos, ou continuar resistindo na esperança de que a corda estoure do outro lado?

Há algumas semanas almocei (num delicioso restaurante especializado em comida do mar Cáspio) com um dos melhores analistas iranianos. Ele fez uma previsão que achei pertinente. “Até agora o Irã tem resistido bem às pressões. O problema é que esse é um jogo de longo prazo, no qual o país corre o risco de seguir o caminho do Iraque de Saddam Hussein, que foi afundando aos poucos antes de ser completamente arruinado pelo isolamento e punições que antecederam a invasão de 2003”.

Verdade que o então Iraque de Saddam e seu arqui-inimigo vizinho persa têm história, perfis e governos muito diferentes. Mas essa queda de braço acerca do protagonismo iraniano continuará, na minha humilde opinião, sendo um dos temas geopolíticos mais interessantes dos próximos anos.

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Visitei a casa onde o aiatolá Khomeini morava

Por Samy Adghirni
01/03/13 13:44

Dia desses aproveitei o clima de ufanismo governista pelo 34º aniversário da revolução islâmica para conhecer a casa onde morou até morrer Ruhollah Khomeini, o aiatolá que fundou o atual estado teocrático iraniano.

Fachada da casa do aiatolá Khomeini, que comandou a Revolução Islâmica

A residência fica num pequeno complexo que leva o nome do bairro onde está situado, Jamaran, conhecido por ser um enclave tradicional num dos bairros mais ricos e modernos de Teerã. Na verdade, Jamaran é um antigo vilarejo ao pé das montanhas que acabou alcançado e cercado pela maré de ruas, lojas, prédios e mansões provenientes do centro, alguns quilômetros ao sul. Imagino que a aura de santidade tenha blindado o local contra a especulação imobiliária. As apertadas ruas vivem cheias de mulheres de chador preto, véu integral sobre o corpo, mais usado em meios tradicionais. Destoando dos shoppings e supermercados que dominam a capital, Jamaran tem vendinhas e pequenos comércios de esquina. A área é deliciosamente mais silenciosa e agradável que os bairros ao sul.

Uma pacata viela pedestre leva até o portão metálico que dá acesso ao complexo onde morava o imã Khomeini _no islã xiita, imã é um título dado a líderes envoltos de santidade. Soldados sem armas, aparentemente jovens em serviço militar, controlam o acesso, que é gratuito. Homens entram de um lado, mulheres, do outro. Uma rampa coberta leva até os locais de visitação. Naquela gelada e ensolarada manhã, havia famílias, alguns turistas estrangeiros e uma excursão escolar.

O primeiro lugar acessível ao público é uma sala subterrânea que abriga uma espécie de museu do Khomeni. A vida do grão-aiatolá (nível máximo nos estudos teológicos do xiiismo) é contada numa sucessão cronológica de fotos pregadas na parede, quase todas em preto e branco. Criança, Khomeini já ostentava o semblante grave que o caracterizou para sempre. Há também registros do jovem Ruhollah estudando no santuário de Qom e, décadas depois, pregando diante de milhares de seguidores contra a a ditadura do xá Reza Pahlevi. Minhas fotos preferidas são as de 1978, quando Khomeini se refugiou num povoado a leste de Paris com seus mais próximos colaboradores. Acho fascinante a imagem desses homens barbudos de túnica e turbante na cabeça rezando no jardim de uma casinha tipicamente europeia, enquanto são observados por ocidentais vestidos à moda dos anos 70. Há outras imagens poderosas, como as da maré humana que recebeu Khomeni em seu triunfal retorno a Teerã, dias depois de o xá ter sido obrigado a deixar o Irã. Uma das fotos mostra um cartaz sobre a multidão no qual os judeus iranianos saúdam a volta do imã. A galeria termina com registros de Khomeni, doente e abatido, numa clínica construída especialmente para tratá-lo, a alguns metros de sua casa em Jamaran, onde morreu em 1989, aos 86 anos, em decorrência de complicações cardíacas e digestivas.

Residência fica no bairro de Jamaran, em Teerã, e abriga exposição sobre líder supremo

O acervo do museu inclui ainda objetos pessoais de Khomeni (óculos, chinelos de couro, passaporte, carteira de motorista, perfume francês Chloé etc), folhas com poemas escritos por ele à mão e cartas enviadas do mundo inteiro com pedidos ao líder. Umas sugerem terminar à guerra contra o Iraque, que se arrastou de 1980 e 1988, outras pedem paz na Palestina, e por aí vai. Na saída da sala, visitantes podem levar para casa, gratuitamente, livros e revistas em vários idiomas que tratam de Khomeini e seu pensamento. Eu fiquei com uma coletânea de artigos, traduzidos para o inglês, nos quais o imã disserta sobre cultura e sociologia do islã.

O segundo lugar a ser visitado é uma mesquita construída rente a um galpão onde Khomeini fazia suas pregações. Local simples, sem grandes atrativos.

A visita a Jamaran termina com um acesso ao pátio e varanda da residência de Khomeini. O lugar é minúsculo e desprovido de qualquer charme. Quarto e sala, literalmente, com uma porta-janela de vidro. A sala tem um sofá e um tapete no chão. Nem mesa nem cadeira nem objeto de enfeite. O dormitório está escondido por uma cortina de pano. O homem que mudou a história do século 20 morava em condições incrivelmente simples, condizendo com sua personalidade austera.

Khomeini não sorria. Ou ao menos não se deixava fotografar com os dentes à mostra. No auge da revolução islâmica, quando um repórter americano lhe perguntou o que sentia ao ser recebido por milhões de pessoas na volta ao país, o imã respondeu: “não sinto nada”. Anos depois, Khomeini afirmou em discurso no rádio que “não há diversão nem piada no islã” (visão amplamente contestada entre muçulmanos, inclusive clérigos). Tudo bem que eram tempos difíceis, com o vizinho Saddam Hussein mandado seus soldados invadirem e bombardearem cidades iranianas, o Ocidente inteiro conspirando contra a revolução islâmica e uma economia em ruínas. Mesmo assim, Khomeini talvez seja o líder político mais estoico dos tempos modernos. O imã se considerava um mensageiro de Deus e, por isso, desprezava emoções, manifestações do ego e apegos à vida material. A dimensão mítica, embalada por um carisma messiânico, era reconhecida até por seus adversários.

Um simpático militar explica, cheio de orgulho, que a casa pertencia a um rico empresário que a doou a Khomeini, mas o líder rejeitou a oferta e fazia questão de pagar aluguel. O rapaz conta ainda que a mulher do imã, descendente da realeza iraniana do século 19, abriu mão de sua imensa fortuna para viver com simplicidade ao lado dele. “O imã Khomeini gostava muito da sua mulher, ele lhe dava muito crédito e a tinha como grande parceira”, garante o guarda.

Para uns, Khomeini foi um herói, um santo xiita que abriu mão de sua vida pessoal para se dedicar aos oprimidos e lançar as bases de um Estado rico capaz de prover amparo social aos mais necessitados. Muitos citam como exemplo de sua nobreza o fato de ter emitido um decreto religioso para permitir que um devoto cidadão pudesse trocar de sexo e virar mulher. O caso de Feyreddun Molkara, em 1984, pavimentou o caminho para a atual lei iraniana que rejeita gays, mas estimula e subsidia operações para mudar de sexo.

Essa imagem positiva é rejeitada por muitos outros, que consideram o primeiro líder supremo do Irã um homem cruel e implacável com opositores e inimigos apontados, entre eles o escritor indiano-britânico Salman Rushdie, que teve a cabeça colocada à prêmio por Khomeini por publicar o livro anti-islã “Versos Satânicos”.

Khomeini quis por muito tempo que seu sucessor fosse o grão-aitolá Hussein-Ali Montazeri, um clérigo com irretocáveis credenciais revolucionárias e grande senso social. Mas o imã mudou de ideia depois que Montazeri criticou violações de direitos humanos na república islâmica. Khomeini decidiu então que seu sucessor seria apontado por decisão colegiada. O escolhido foi Ali Khamenei, atual líder supremo. Mas o rosto de Khomeini continua até hoje onipresente em eventos e ambientes oficiais, lado a lado com o retrato de Khamenei.

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Irã e EUA, aliados para salvar a luta livre

Por Samy Adghirni
20/02/13 09:40

Irã e EUA estão deixando de lado sua inimizade mútua (ou parte dela) em nome do amor pelo esporte.

Os dois países acabam de selar um pacto unindo forças numa campanha mundial para evitar que a luta livre, paixão e glória de iranianos e americanos, seja banida das modalidades olímpicas.

O lutador olímpico americano Jordan Ernest Burroughs, medalha de ouro em Londres, abraça o iraniano Sadegh Saeed Goudarzi, que levou a prata

A aliança é uma resposta aos planos do Comitê Olímpico Internacional (COI), anunciados há duas semanas, de excluir a luta livre a partir de 2020, o que faria do Rio de Janeiro o último palco olímpico de um dos esportes mais antigos do mundo.

O argumento do COI é de que a modalidade tem pouco apelo popular e pouca visibilidade na mídia _uma maneira elegante de dizer que os patrocínios e o dinheiro movimentado são insuficientes. A decisão será discutida na próxima reunião do COI, na cidade russa de São Petersburgo, no fim de maio. Em setembro, um voto dos 100 e poucos membros do comitê decidirá se a luta livre se manterá na Olimpíada ou cederá lugar a uma das modalidades na fila de espera para entrar na principal competição esportiva do mundo. O páreo é duríssimo, pois os concorrentes da luta incluem atividades modernas e badaladas, como baseball, caratê e wakeboarding.

A ameaça à luta livre surgiu às vésperas do Mundial da modalidade, que se inicia hoje, quarta-feira 20 de fevereiro, justamente no Irã. O assunto tomou conta das delegações no complexo esportivo Azadi, a sudoeste de Teerã, palco da competição. Todas as grandes nações do esporte estão representadas, entre as quais Turquia, Japão, Rússia, Geórgia, Belarus e EUA (sim, cidadãos americanos podem entrar no Irã, inclusive turistas).

Movidos por pragmatismo e pelo tal espírito olímpico, que prega a superação das divergências políticas, os chefes das federações iraniana e americana marcaram de se reunir para delinear uma estratégia comum. Outras forças da luta livre formarão parte dessa frente, mas a república islâmica e a superpotência americana pretendem ser protagonistas.

“O Irã é um dos nossos aliados mais poderosos [na] luta livre”, disse o diretor das seleções americanas de luta livre, Mitch Hull, ao desembarcar em Teerã, na última terça-feira. “Estamos confiantes de poder trabalhar com a federação iraniana de luta livre, com os lutadores iranianos e com o povo iraniano para mostrar ao mundo que, independentemente do que acontece na política, temos o mesmo objetivo, a mesma crença e a mesma paixão [pelo esporte]”, disse.

O presidente da federação iraniana, Hojatollah Khatib, disse que os dois países devem “mostrar sua união” para resistir “com determinação” aos planos do COI.

Irã e EUA já haviam demonstrado uma louvável cordialidade na Olimpíada de Londres, em agosto, quando o superastro americano Jordan Burroughs, após faturar o ouro na final contra o iraniano Sadegh Saeed Goudarzi na categoria até 74 kg, abraçou e posou para foto com o adversário. Burroughs, que está em Teerã por conta do campeonato mundial, recebe tratamento VIP por parte do público iraniano. Competidores dos dois países se conhecem por encontrar-se com freqûencia em competições internacionais e nutrem uns pelos outros um profundo respeito mútuo. Nos anos 90, o técnico da seleção iraniana juvenil de luta livre era americano.

Mas enquanto os EUA podem continuar contando com um vasto leque de campeões olímpicos em outros esportes, o Irã perderia sua principal força em caso de exclusão da luta livre. Nos jogos de Londres, iranianos arremataram metade das medalhas disputadas na luta livre, incluindo três ouros. Com isso, a república islâmica obteve uma honrosa 17ª colocação no quadro de medalhas, à frente inclusive do Brasil. Sem luta livre, as chances de medalha do Irã cairiam drasticamente.

O amor dos iranianos por luta livre é quase tão antigo quanto seu país. Há relatos de lutas entre reis persas e até mesmo entre figuras do islã xiita. Na tradição local, espera-se que os grandes lutadores sejam homens dignos, honestos e generosos. Uma áurea de quase santidade envolve os campeões. Um dos grandes heróis nacionais da era moderna é Gholamreza Takhti, que se opôs à ditadura secular do xá Reza Pahlevi e acabou morrendo em circunstâncias não esclarecidas, em 1968.

O esporte já foi usado como ferramenta política para diluir tensões entre os EUA e seus inimigos. O caso mais famoso foi a chamada diplomacia do ping pong, que abriu um canal com a China em plena Guerra Fria, pavimentando o caminho para a visita do então presidente americano Richard Nixon a Pequim, em 1972. Mas o mundo mudou. Ficou mais complexo e menos idealista. Uma mágoa quase insuperável norteia a percepção mútua entre Teerã e Washington. Ninguém espera que a camaradagem entre atletas e federações tenha qualquer impacto no plano político.

P.S.: Três dias após a publicação deste post, o Irã sagrou-se campeão mundial de luta livre, derrotando a Rússia na final, em Teerã. Os EUA terminaram em terceiro lugar. O presidente Mahmoud Ahmadinejad foi pessoalmente cumprimentar os atletas do país inimigo, com quem posou, sorridente, para fotos. Algumas imagens da acolhida americana em Teerã aqui registradas:

http://www.dailymail.co.uk/news/article-2283655/Freestyle-Wrestling-World-Cup-American-team-shake-hands-Iranian-President-Ahmadinejad-Tehran.html

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