Papel da mulher opõe líder supremo e Rowhani
22/04/14 12:55No seu segundo e último mandato, o ex-presidente Mahmoud Ahmadinejad caiu em degraça depois de desafiar a autoridade do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, chefe absoluto do Estado iraniano.
Eis que agora o sucessor de Ahmadinejad, o bem comportado Hasan Rowhani, também resolveu divergir abertamente de Khamenei.
O embate se deu sobre um dos temas mais polêmicos: o papel da mulher na sociedade. O assunto está quente por conta do Dia da Mulher, que o Irã festejou no último sábado, aniversário de nascimento de Fatima Zahra, filha do profeta Maomé.
Discursando em Teerã diante de centenas de mulheres cobertas da cabeça aos pés com o chador, o tipo de véu que identifica maior devoção religiosa, Khamenei foi direto ao ponto: “Um dos maiores erros do Ocidente em relação às mulheres é a igualdade de gênero.”
Assim falou o líder: “Por que um emprego masculino deveria ser dado a uma mulher? Que orgulho uma mulher pode ter ao ter um emprego masculino?”.
Khamenei disse que o islã “não faz distinção” entre gêneros, mas ressaltou que se trata de “duas formas – uma para um tipo de atividade, outra para outro tipo de atividade.”
Aos olhos do líder supremo, a atividade da mulher é simples: cuidar do lar e zelar pelo bem estar da família. “Mulheres dentro de casa trazem paz, paz para o homem, paz para as crianças. Se uma mulher não tem paz mental e espiritual, ela não pode dar paz à família. Uma mulher que é humilhada, xingada, pressionada pelo trabalho, não pode ser uma boa de casa, não pode administrar o lar.”
No dia seguinte, domingo, foi a vez de Rowhani falar em homenagem às mulheres, também durante evento público em Teerã. Numa aposta certamente popular junto à opinião pública, mas politicamente arriscada, o presidente escolheu ir na direção oposta à de Khamenei.
“Mulheres devem ter oportinidades iguais, benefícios iguais e direitos sociais iguais”, disse o presidente da república islâmica. “Será possível marginalizar metade da sociedade?”
Em dois trechos de sua fala, Rowhani pareceu pedir licença para discordar de Khamenei.
“Àqueles que têm medo da presença e da excelência das mulheres […], por favor abstenham-se de atribuir essas visões erradas à religião, ao islã e ao Corão”, disse Rowhani, que é clérigo, mas de um nível hierárquico inferior ao do líder supremo.
“É verdade que o lar é o sustentáculo da sociedade e que a reforma começa em casa, mas se ignorarmos metade da população do país, não veremos desenvolvimento verdadeiro e crescimento neste país.”
Mesclar a questão da mulher à economia foi uma jogada astuta. O que Rowhani pareceu dizer é: “Para amenizar o terrível efeito das sanções e o fracasso das políticas populistas de Ahmadinejad, precisamos contar com o máximo da nossa força de trabalho, e isso inclui as mulheres.”
Rowhani comemorou o fato de as mulheres terem se tornado protagonistas em todas as áreas da sociedade, mas admitiu que “ainda falta muito para atingir [a] meta [da igualdade de gênero.]”
Foi um posicionamento corajoso por parte de Rowhani. Afinal, o líder supremo tem status de santo, e contestá-lo pode trazer problemas. Ahmadinejad teve vários atritos com Khamenei, desde nomeações de ministros até divergências ideológicas e diplomáticas.
Ao contrário de Ahmadinejad, Rowhani tem um amplo apoio social, que se estende dos reformistas tradicionais até alguns religiosos, passando pelos segmentos mais liberais. Mais importante ainda é o fato de as mulheres terem votado em massa em Rowhani na eleição do ano passado. É compreensível que o presidente lhes deva alguma satisfação, apesar da pressão dos ultraconservadores.
Para além do dossiê nuclear, da relação com o Ocidente e da gestão econômica, o abismo acerca de questões morais e culturais entre Rowhani e seus adversários promete ser um dos mais perigosos pontos de atrito interno pelos próximos anos.
Sobre a questão da mulher no Irã, sugiro a leitura de uma reportagem que escrevi no mês passado para o caderno “Ilustríssima”.
Samy, boa noite!
Li esta entrevista, não tive como não recordar de você.
Sobre a proibição do véu, pelo pai do xá, que, incoerentemente, acabava afastando as mulheres da escola.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-026X2008000100016&script=sci_arttext
Samir, até que ponto a divergência nos discursos do líder supremo e do Presidente do Irã pode originar uma crise Politica? Sabendo que o líder supremo tem a ultima palavra em todas as questões, que autonomia tem o presidente para implementar politicas de igualdade do género?
Dilson, o presidente Rowhani sabe bem dos limites impostos pelo sistema. Ele pode até divergir do líder supremo, mas seria politicamente suicidário comprar briga com o chefe máximo do Estadpo, que controla todo o aparato de segurança.
Samy, vi esta notícia.
A gasolina, ainda que sem subsídio, irá a uns R$ 0,50 o litro. Isto é barato aí?
A informação é que o governo quer acabar com o subsídio no setor energético e liberar o controle de preços.
Tal política econômica não é considerada ‘ocidental’?
A sociedade vem discutindo isto?
Há apoio geral?
http://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2014/04/25/interna_internacional,522484/ira-anuncia-forte-aumento-do-preco-dos-combustiveis.shtml
Salomão, o corte dos subsídios está afetando o dia a dia de muita gente, e quando o bolso aperta, não há justificativa válida. O governo é obrigado a adotar políticas econômicas mais rigorosas. Prova de que as autoridades iranianas são mais pragmáticas do que se imagina.
Olá Samy!
Vi esta reportagem no R7, são várias fotos sobre o Irã, ou melhor, sobre as iranianas.
Você que mora aí, o que diz, confere com a realidade?
http://noticias.r7.com/esquisitices/fotos/ira-possui-armas-e-bombas-mas-nao-tem-canhoes-25042014#!/foto/7
http://noticias.r7.com/esquisitices/fotos/ira-possui-armas-e-bombas-mas-nao-tem-canhoes-25042014#!/foto/3
Junior, existem, de fato, muitas mulheres bonitas no Irã.
Não quis perguntar isto, se as mulheres são bonitas ou não.
Mas, você viu todas as fotos? Coloquei duas, mas tem várias, se conseguir abrir a postagem.
Minha dúvida é saber, pelo que você vê das fotos, elas são verdadeiras?
Realmente retratam o cotidiano de iranianas?
Se afirmativo, são imagens completamente distantes do esteriotipo que estamos acostumados a ver.
Pergunto mais: sendo estas cenas verídicas, são algo distante do cotidiano do Irã, ou não?
Caso não sejam, realmente eles vivem aí em um regime dividido com um abismo entre o povo.
Junior, estereótipos devem ser combatidos, não? Para entender melhor as complexidades e contradições da situação da mulher no Irã, sugiro que leia a reportagem que escrevi recentemente para o caderno Ilustríssima.
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2014/03/1432402-realidade-velada.shtml
Boa tarde Samy,
muito interessante o post. Gostaria apenas de comentar que acho que o Aiatolá não deve olhar para a própria sociedade também, pois as mulheres mais jovens nem usam o hijab mesmo, digo cobrindo o cabelo e o pescoço todo usando como se fosse um xale mesmo…Assim fica dificil dele ter alguma razão nessa das mulheres, mas como disse eu só acho
Samy sei que não tem nada a ver com o assunto, mas fiquei realmente surpreso com a informação abaixo. Você saberia me dizer se isso acontece com frequência ? Este tipo de clemencia por parte da família da vitima é sempre permitido ?
http://oglobo.globo.com/blogs/pagenotfound/posts/2014/04/17/homem-que-seria-enforcado-recebe-tapa-e-perdoado-pela-mae-da-vitima-531779.asp
Andre, escrevi reportagem sobre este tema: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2014/04/1442278-iraniano-prestes-a-ser-enforcado-e-perdoado-por-mae-de-vitima.shtml . Trata-se de um caso raríssimo.
Dizer que o lider supremo é um autocrata, tal qual um monarca absoluto, é exagero?
O líder supremo é a autoridade máxima e absoluta do Estado iraniano. Ele detém a palavra final sobre todo e qualquer assunto.
Samy, quando os iranianos vêem o exército do Egito ‘pondo quente’ em cima dos islamitas da Irmandade Muçulmana, eles não ficam com inveja?
No sentido de que o exército do Irã, na época da Revolução de 1979, ter algum tipo de piedade dos revoltosos?
max weber, eu te garanto que no Irã ninguém ou quase tem inveja do que acontece no Egito. Como eu venho dizendo neste espaço, sociedade e regime aprenderam a conviver um com o outro. Iranianos querem mudanças, sem dúvida, mas o que acontece no Egito e na Síria reforça a impressão geral de que não vale a pena lançar-se numa revolução. O Irã, apesar de tudo, é estável, seguro e razoavelmente desenvolvido.
Entendo suas palavras Samy, elas refletem o mundo atual.
Escrevo aqui como exercício ilustrador de debate.
Os movimentos do islã político, atualmente, têm como referência o Irã.
Na época da Revolução de 1979 não havia esta referência.
Talvez pensava-se que haveria uma assembleia constituinte, um estado democrático.
Não a implantação de uma liderança maior não eleita.
Parece que o medo de todos é se tornar um Irã.
Pergunto a você, como uma ‘fábula’.
SE OS EGÍPICIOS, SÍRIOS, TUNISIANOS, LÍBIOS, PERGUNTASSEM AO POVO DO IRÃ.
“Reprimir os islamitas, ou entregar o poder a eles, o que os iranianos diriam?”
Acho essa divergência saudável, o Islã comparada as outras religiões (judaísmo e cristianismo) é das mais igualitárias trazendo direito ao Divórcio e a propriedade de bens das mulheres (no Ocidente isso só aparece no século XIX).
Quanto a questão do trabalho existe essa divergência, mas se formos ver que no brasil 70% da população que não trabalha e nem estuda (nem-nem) são mulheres donas de casa, podemos ver que essa questão do acesso ao mercado pelas mulheres é um problema global.
Acho que uma sociedade igualitária é aquela que permite que tanto o homem como a mulher possam trabalhar e/ou ser dono (a) de casa, basicamente, cada um no seu quadrado.
Sim, tem um mandato, ou o cargo é vitalício?
Qual a origem do cargo, suceder o imperado
Há movimentos de direitos femininos no Irã?
Li sua ótima matéria sobre as mulheres iranianas.
De uma forma geral, qual a visão que você acredita ser a majoritária entre as mulheres do Irã.
A do presidente, ou a do líder supremo?
O cargo é vitalício, a não ser que a Assembleia dos Peritos decida remover o líder. Existe, sim, movimento pelo direitos das mulheres no Irã, conforme explicado na minha reportagem sobre a condição feminina no Irã. Visão majoritária entre as mulheres? Essas coisas são difíceis de avaliar. Existe alguma “visão majoritária” entre as brasileiras sobre a condição feminina? O Irã, como o Brasil, é cheio de opiniões divergentes, difícil estabelecer uma visão monolítica. O ponto de vista do líder supremo e do presidente estão detalhados na última coluna.
Samy, como tenho acompanhado seu blog e suas reportagens na Folha, percebo que a situação das mulheres no Irã, em termos de direitos civis, é bem distinta da situação das mulheres em outros países, como a Arábia Saudita, por exemplo. Minha pergunta é: que direitos as mulheres no Irã não tem que as brasileiras têm? Pelo que vejo, as únicas diferenças dizem respeito à liberdade de comportamento social (vestimenta que no Irã são obrigatórias). Me parece que nos demais aspectos da vida, as mulheres aí tem os mesmos direitos que as daqui, não é? Trabalham fora, fazem carreiras profissionais, se divorciam, dirigem, votam, etc.
Grande abraço
Fernando, as brasileiras têm uma grande vantagem em relação às iranianas: igualdade perante a lei. As iranianas trabalham, namoram, comandam empresas etc, mas seu status legal é inferior ao do homem. Tudo isso está detalhado na reportagem mencionada ao fim da coluna:
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2014/03/1432402-realidade-velada.shtml
Esta divergência, restrita ao nível de palavras, pode seguir ao plano das ações governamentais?
Curiosidade: como se faz para virar santo, no caso do líder supremo, ele foi eleito para tal cargo?
Tem mandato?
Lábios de fel, é possível que surjam divergências em matéria de ações governamentais. Por ora, apenas retórica. O líder supremo é apontado pela Assembleia dos Peritos, conselho de 86 juristas e clérigos. A assembleia também monitora atividades do líder supremo, podendo, ao menos em tesem removê-lo se julgar necessário.
Samy, em uma de suas colunas, você disse que mulheres, nas piscinas dos condomínios, usam maiôs, biquines e similares.
Poderia colocar umas fotos disto?
Não mostrando o rosto, para não ter problemas, nem identificando o local.
Acho interessante.
Carioca, as mulheres não gostariam que sua foto de biquini fosse parar nas páginas do jornal nem eu gostaria de deixá-las assim expostas.