Procura-se assistente
21/01/14 10:50Lá se vão cinco semanas desde que minha assistente pediu as contas. Cinco semanas trabalhando sozinho, com freio de mão puxado.
Sem assistente não consigo tocar nenhuma entrevista mais séria, pois meu farsi só dá para conversas informais. Também fico sem me comunicar com escritórios do governo, que, na maioria das vezes, pedem envio de faxes em farsi. Mais de mês sem alguém para me mandar a indispensável resenha diária de imprensa local. Brigar sozinho com a provedora de internet ou a empresa de telefonia fixa tem sido uma provação.
Uma boa assistente faz as vezes de repórter, ajudando a enxergar e executar pautas. Por isso, a pessoa que procuro não é secretária nem tradutora. Aliás, a escolhida obterá uma credencial de imprensa oficial do Escritório de Mídia Estrangeira do Ministério da Cultura e da Orientação Islâmica igual à minha. Seremos ambos jornalistas no mesmo barco.
Faço questão que seja mulher. É consenso entre estrangeiros que iranianas são mais espertas e dedicadas que os rapazes. Além disso, uma parceria feminina é indispensável para bisbilhotar áreas às quais, como homem, não tenho acesso.
A candidata ideal deve ser séria, curiosa e corajosa. Precisa ter inglês irretocável, falado e escrito. Quem se interessa por temas políticos e econômicos leva vantagem. Como se trata de um emprego em meio período numa área muito específica (jornalismo iraniano não atrai multidões), privilegio jovens dispostas a aprender.
Mas está difícil.
As candidatas que tinham ido bem nas outras vezes em que procurei alguém estão todas empregadas. Uma delas respondeu à minha mensagem no Facebook de forma um tanto ríspida, como que se quisesse se vingar por eu tê-la preterido, lá atrás. Esnobei e agora sou esnobado. É o jogo.
Teerã inteira sabe do meu desespero. Nos eventos sociais, alguém sempre tem uma dica, mas aquela “sobrinha brilhante” ou “amiga que já escreveu artigos para jornal” geralmente já está ocupada. Me pergunto se essa fartura de empregos não é sinal de que a economia pode estar ressuscitando desde a eleição do presidente Hasan Rowhani, em junho.
Na semana passada, consegui marcar entrevista com algumas candidatas. Uma delas era esperta e motivada, mas soube responder a apenas uma das dez questões do meu teste de conhecimentos sobre noticiário iraniano. Outra apareceu acompanhada do pai, que tinha decidido ver minha cara a pedido do… marido da moça! Resmunguei que o encontro, num café, era uma conversa reservada, e o pai teve que sair para dar uma volta. Mas ficou ligando de dez em dez minutos para perguntar se a entrevista estava perto de acabar. Coitada da moça, ficou constrangida que só, ciente do papelão. Mas imaginem esse marido e esse pai o tempo todo na nossa cola. De todo modo, ela não foi bem no teste.
A última entrevistada chegou insegura e tímida. Mas gabaritou o questionário e não só sabia o que era um lide como mostrou com orgulho matérias sobre tecnologia que ela assinou em jornais importantes de Teerã. Essa tem chances. A ver.
A escolhida terá a dura missão de assumir um lugar que foi ocupado até meados de dezembro por uma jovem inteligente e com real talento para reportagem. “Samy se deu bem, essa moça leva jeito”, diziam outros correspondentes, ao vê-la fuçando onde não devia ou cobrando informações de assessores presidenciais. Ela, de fato, era arretada. Até demais. Sua cabeça quente se tornou um problema. E eu admito ter exigido além da conta, algumas vezes. Dias antes de eu embarcar para alguns dias de descanso no Brasil, ela mandou carta de demissão e foi atrás de um namorico no exterior.
Antes dela, eu havia trabalhado com outra moça, recomendada por um amigo. Vacilo ter aceitado. Eu havia acabado de chegar no Irã, em 2011, e estava atordoado, sem rumo e com pressa para começar a produzir. Me esforcei para treiná-la, mas a moça não gostava dessa coisa de jornalismo. Sem vibração, sem energia pessoal, não há êxito nesta profissão. Decidi mandá-la embora depois que ela traduziu errado e se confundiu com uma notícia importante.
Espero que a terceira assistente seja a última.
Samy, não sei por qual canal posso faze-lo, por isso foi usar esse espaço. Acho uma boa ideia fazer uma reportagem sobre esse assunto: http://keyhani.blog.lemonde.fr/2014/01/22/quand-des-musiciens-iraniens-se-mettent-a-lair-guitar-un-pied-de-nez-aux-autorites/
“Uma parceria feminina é indispensável para bisbilhotar áreas às quais, como homem, não tenho acesso.”
Achei curioso esta afirmação visto que,em um país onde dizem que a mulher é reprimida vejo isso de muito bom grado!
Pergunta off tópico:Existem outros correspondentes brasileiros no Irã?
Moisés, sou o primeiro e até agora único correspondente no Irã.
Fiquei muito surpreso ao notar que a folha simplesmente eliminou seu blog. Agora estou sabendo o motivo, espero que vc tenha sucesso em conseguir logo uma boa assistente iraniana.
O Iran é um pais que me interessa bastante e um dos motivos é por ser um dos poucos que enfrenta os “donos do mundo”. No Oriente Médio o Iran é o pais mais imporante atjualmente, apesar de ser não ser arabe – o que muita gente desconhece.
Outro dia vi aqui no canal Sportv sobre o Iran como pais participante da Copa no Brasil. O que mais me chamou a atenção foi como o pessoal de Abadan adora o futebol brasileiro, tanto que o time local atem as cores brasileiras e tem um bar enfeitado de fotos do futebol brasileiro
Neco, onde você viu que a Folha eliminou meu blog? Meu blog nunca saiu do ar. Se houver qualquer problema de acesso, peço que me avise, por favor.
Samy,
Esqueci de algumas infos: ela tem 29 anos, inglês absolutamente fluente e francês intermediário.
Qualquer dúvida me avisa.
Abs e boa sorte.
Oi Samy,
Tenho uma amiga em Teerã que acho que se encaixa no perfil.
Formada em Ciências Políticas pela Universidade de Teerã e com mestrado em Ciências da Comunicação pela mesma instituição; é curiosa, inquieta e antenada com assuntos da realidade iraniana e com os acontecimentos políticos do país. Me ajudou muito com a tese de fim de curso sobre o mercado de publicidade no Islã.
Abraços!
Deve ser realmente complicado conseguir empregar alguém em um país estrangeiro e com algumas peculiaridades sociais distintas da nossa. Acredito que na Irã deve ser mais ou menos como no Brasil no que se refere a questão do idioma estrangeiro , não devem ser tantos os fluentes em inglês, talvez seja restrito aos filhos da classe nobre da sociedade que dispõe de bons colégio para educar seus filhos.
André, por incrível que pareça, é comum pessoas falarem inglês por aqui, muito mais do que no Brasil. Infelizmente, o problema é outro. O difícil é achar gente disposta a trabalhar com jornalista e levar jeito para isso.
Gostaria de ter contato contigo! Conhecer melhor.Obter mais conhecimento.