Empresas ocidentais querem voltar ao Irã
22/10/13 17:10O pedido partiu de dois dos maiores capitães da indústria petroleira mundial: sanções ao Irã precisam ser levantadas rapidamente.
Peter Voser, diretor executivo da Royal Dutch Shell, e Christophe de Margerie, da Total, deixaram claro que não veem a hora de voltar a assinar contratos com o país que detém 11% das reservas mundiais de petróleo e 15% das de gás.
O assunto ressurgiu com força desde que negociações sobre o programa nuclear iraniano entraram numa era de otimismo com a chegada do pragmático Hasan Rowhani à Presidência da república islâmica, em agosto.
Em recente conversa com jornalistas, numa conferência internacional sobre petróleo, em Londres, Voser usou o argumento do interesse coletivo: “No longo prazo, os recursos em petróleo e gás do Irã terão de ser desenvolvidos para atender a demanda [mundial]”
Falando no mesmo evento, De Margerie disse esperar que negócios petroleiros com Teerã voltem a ser permitidos “o mais rápido possível, não só para a Total, mas para o mundo e para o Irã.”
Shell e Total são parte do grupo de gigantes petroleiras que foram obrigadas a deixar o Irã nos últimos anos por causa do acirramento das sanções.
O “Financial Times” garante que o retorno do investimento ocidental no setor de hidrocarbonetos iraniano poderia jogar o preço mundial do barril de petróleo para abaixo de US$ 100.
Tudo isso expõe o abismo que separa atores políticos e econômicos no Ocidente quando o assunto é Irã.
Dirigentes e diplomatas de EUA e Europa passaram boa parte da última década pressionando Teerã a suspender seu programa nuclear, suspeito de ter fins militares, o que o Irã nega. Quantos mais sanções eram impostas, maior a dificuldade econômica para a república islâmica.
O problema é que as punições também representaram um golpe duríssimo para empresas ocidentais (não só petroleiras) acostumadas a fazer negócios num país que tem 77 de milhões de habitantes, colossais reservas financeiras e uma sociedade jovem com um dos níveis de vida mais elevados da região.
Exemplo mais eloquente é o da Peugeot. O mercado iraniano era um dos únicos no mundo em que a empresa francesa ganhava dinheiro. Sim, sanções empobreceram a população, e as vendas vinham caindo. Mas a retirada total e definitiva do país, em 2011, custou caríssimo e empurrou a empresa para mais perto da falência.
Para piorar, a retirada ocidental abriu caminho para concorrentes chinesas e coreanas, que agora nadam de braçada no Irã.
Empresas ocidentais vivem implorando que seus governos evitem medidas que afetem o interesse público. Principalmente em tempos econômicos tão incertos nos EUA e na Europa.
Existem até diplomatas que, em conversa reservada, admitem discordar de seus governos. Um funcionário de país europeu me confidenciou o seguinte: “Nossa embaixada em Teerã calcula que, se pudéssemos normalizar negócios com o Irã, notaríamos uma incidência positiva no nosso PIB. Mas dependemos das normas da União Europeia, e essas normas seguem a linha dura contra o Irã”.
Algumas empresas ocidentais resolveram remar contra a maré e ficaram no Irã. Abordei esse tema numa reportagem publicada na versão impressa da Folha, no mês passado. Mas, há anos, a tendência dominante é a inversa.
Tudo pode mudar em função das conversas entre o governo Rowhani, que prometeu acabar com as sanções, e as potências. E o clima entre os negociadores nunca foi tão bom.
Com aval do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, chefe máximo da teocracia iraniana, a equipe de Rowhani deixou claro, nas mais recentes negociações, que está disposta a atender várias exigências ocidentais para aumentar a transparência de seu programa nuclear. Rowhani até falou ao telefone com Barack Obama há algumas semanas, no primeiro contato entre dirigentes dos dois países em 34 anos de inimizade.
Governos ocidentais até agora não disseram se estão dispostos a responder à altura à oferta iraniana, cujos detalhes são mantidos em sigilo para preservar as negociações. Além disso, tanto em Teerã como nas capitais ocidentais existe uma mobilização significativa de forças radicais contrárias ao apaziguamento.
Mas a movimentação já é frenética entre as multinacionais. O jornal francês “Le Figaro” revelou que a General Motors discretamente enviou várias equipes a Teerã para preparar uma volta ao mercado do qual estava fora desde a queda da ditadura pró-Ocidente, em 1979. Ainda segundo o jornal, a Boeing está pronta para arrematar futuros contratos para renovar a envelhecida frota das empresas aéreas iranianos, impedidas de comprar aviões novos por causa das sanções. “A matéria do ‘Figaro’? Tudo verdade”, me garantiu um alto funcionário de multinacional francesa.
Na área petroleira, o novo governo já avisou que fará preço promocional para quem se mostrar mais disposto a retomar investimentos.
O economista Mehrdad Emadi, da consultoria Betamatrix, em Londres, me contou que o potencial econômico do Irã é um dos fatores que levam o Ocidente a se interessar por um acordo nuclear. Mas o economista ressalta que cabe também ao governo iraniano fazer mudanças necessárias para trazer de volta investimentos e expertise ocidentais.
“À luz dos muitos encontros que tive com empresários, acredito que o Irã agora é visto como um país com promessas de oportunidade sem igual, caso o país melhor seu marco regulatório para torná-lo compatível com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). […] É concebível que o Irã se torne nos próximos cinco a oito anos o mercado mais disputado […] do Oeste asiático e do Oriente Médio.”
E o Brasil nisso tudo?
Brasileiros já investiram no Irã. A Petrobras tinha um contrato de prospecção. A Volkswagen possuía linha de montagem do modelo Gol. As duas empresas saíram do Irã há anos.
O Brasil hoje tende a enxergar o Irã como mero importador. A verdade é que empresários brasileiros não têm muita paciência para lidar com os perrengues inerentes a qualquer negócio com o Irã (complicações e atrasos de pagamentos, burocracias, distância etc), mesmo que os iranianos tenham o salutar hábito de pagar em cash e 100% adiantado. A corrente comercial bilateral, quase toda composta por exportações brasileiras, se mantem em cerca de US$ 2 bilhões, cifra honrosa, mas muito distante do potencial.
Um diplomata iraniano mandou o seguinte recado: “Estamos dispostos a comprar todo tipo de produto do Brasil. Temos demanda e temos dinheiro. Mas falta vontade do lado brasileiro. […] No dia em que as sanções forem levantadas, iranianos se voltarão todos para Europa e EUA.”
No mês passado, iranianos indicaram disposição do presidente Rowhani para um encontro com Dilma às margens da última Assembleia Geral da ONU. O governo brasileiro não levou a conversa adiante.
Li todos os comentarios. Nao vi nenhum relacionamento do perigo de que o atual governo do Iran tenha bomba atomica.
Cada mes que passa eles estao mais pertos
de montar a primeira bomba atomica deles.
Esta foi a razao de todas as sancoes ao Iran.
Ótima matéria, Samy! Espero que dessa vez o Brasil não seja o último a chegar no mercado iraniano, enquanto os países que pregam essas sanções já estáo se articulando, por baixo dos panos, apesar do discurso oficial dos seus governos. O novo presidente é pragmático e muito mais inteligente que o antigo. O progresso econômico com distribuição é a melhor garantia para a Paz.
Moral da história: O dinheiro acima de tudo.Pouco importa as graves violações dos direitos humanos, com um dos maiores números de pena de morte do mundo, inclusive por meios ultra-cruéis como enforcamento em praça pública, mutilações, apedrejamentos(ocorridos mesmo que banidos por lei recente).Como dizem o grande filósofo francês Jean Paul Sartre: O ser humano humano não tem limites na sua perversidade.
Samy, vc está no Twitter?
Não estou, Beron.
Todo mundo merece uma chance, afinal o sol nasceu pra todos.Pena que alguns brasileiros não estejam vendo uma oportunidade dessas, sera que a Embraer não ta vendo um futuro cliente, e não é qualquer um, é cliente com dinheiro do petrodólares.Este país precisa se desenvolver a Petrobras pode participar disso, ajuda-los com tecnologia e pessoal.
Que acabem as sanções, que entrem as empresas multinacionais e que o Irã volte ao cenário global como potência regional que sempre foi! O que não significa dizer que o Ocidente faça vistas grossas às pretensões bélicas do governo de Teerã e seu desrespeito aos direitos humanos. Está evidente que isolar um país não é a melhor solução para os problemas diplomáticos. Quando mais inserido no cenário global, nas convenções internacionais, no diálogo diplomático, mais fácil se contornar diferenças, propor mudanças, fiscalizar e exigir cumprimentos de acordos. Quando se faz de uma nação um “pária” no cenário global é como dar um aval para que seu governo cometa as maiores loucuras. Daí, para a guerra é um passo. Lição que Estados Unidos deveria já ter aprendido.
E nesta cartada iraniana, o ex presidente Lula se mantinha no caminho correto, afinal, vislumbrando este mercado potencial.