Obama x Irã: melhores inimigos
07/11/12 20:45Por mais que dissessem que não estavam nem aí, que Obama e Romney eram farinha do mesmo saco, os dirigentes iranianos andavam para lá de apreensivos com a eleição americana. Ninguém está soltando rojões em Teerã pela vitória do democrata, que afinal de contas não somente impôs as sanções mais duras contra o Irã como também pressionou a Europa a fazer o mesmo. Ainda assim, há uma clara sensação de alívio na cúpula do regime. E é fácil entender por que.
Enquanto Romney amplificava os tambores da guerra, endossando abertamente planos israelenses de atacar o Irã para destruir suas centrais nucleares suspeitas de fabricar a bomba, Obama sempre deixou claro que não gostava dessa ideia. Para o comandante em chefe das tropas americanas, que recebe diariamente relatórios de inteligência sobre o Irã e muito mais, bombardear a República Islâmica era uma operação sem objetivo estratégico claro (destruir todas as instalações ou só as de enriquecimento de urânio? atacar também alguns centros de poder em Teerã? fazer “apenas” uma demonstração de força ou ir até o fim e derrubar o regime?) e potencialmente muito arriscado. Além das incógnitas militares e diplomáticas acarretadas por um bombardeio, uma disparada do preço do barril de petróleo em caso de guerra poderia minar de vez qualquer retomada sustentável da economia americana.
Obama obviamente não quer uma bomba nuclear nas mãos do regime que é a maior pedra no sapato dos EUA no Oriente Médio. Mas ele também não compartilha o sentimento de Israel em relação ao Irã, o que lhe valeu inimizade eterna de muitos israelenses, a começar pelo premiê Netanyahu. O Estado judaico, apesar de ser o único país na região a ter a bomba atômica, diz encarar o programa nuclear iraniano como ameaça existencial e aponta a seu favor para o evidente ódio antisionista dos líderes iranianos. Obama e sua equipe acham que não só Teerã não decidiu fabricar a bomba como também levaria uns bons anos até alcançar esse objetivo caso optasse por ele. Aí entra a famosa divergência entre Israel e EUA sobre qual a linha vermelha a não ser ultrapassada por Teerã sob pena de levar chumbo:
– Obama considera aceitar que o Irã enriqueça urânio a níveis baixos para gerar energia e produzir tratamentos contra o câncer (o que Teerã tem direito de fazer por ser membro do Tratado de Não Proliferação Nuclear), mas ai dos aiatolás se eles claramente optarem pela bomba -o que, caro leitor, ainda não foi provado, apesar de incontáveis inspeções e do monitoramento das centrais iranianas 24h por dia por câmeras conectadas diretamente à ONU. Suspeitas, por mais afiadas, não constituem provas.
– Para Israel, o Irã é um regime tão pouco confiável que ninguém deveria permitir que tivesse qualquer tipo de programa nuclear. Aos olhos de Netanyahu, ou Teerã encerra tudo de vez ou os hípertreinados pilotos de caças israelenses se encarregarão dessa missão.
Embora nunca tenha em tese descartado a hipótese de ajudar Israel num eventual ataque, Obama claramente priorizou outro tipo de ferramenta contra o Irã: a pressão econômica total e absoluta.
As sanções impostas pelo americano e seus aliados europeus neste ano baniram as vendas de petróleo iraniano à Europa e excluíram o Irã do sistema financeiro internacional, tornando cada vez mais difícil a entrada de dólares e euros nos cofres de Teerã. Aí também não está claro se o objetivo é derrubar o regime ou forçá-lo a aceitar algum tipo de compromisso. Mas o fato inegável é que a economia iraniana está sufocando, e eu vejo isso diariamente _queda vertiginosa da moeda nacional, inflação incontrolável, salários atrasados, desemprego em alta, esfriamento geral do comércio etc. O astral anda péssimo por aqui, inclusive entre os ricos do norte de Teerã.
O Irã, como era de se esperar, amaldiçoa a Casa Branca por tudo isso. Alguns dias atrás uma multidão juntou-se em frente ao prédio que abrigava a embaixada americana para comemorar o 33º aniversário da tomada de reféns que durou um ano e meio e selou o fim das relações entre Teerã e Washington, até então grandes amigos. Ouviram-se o clássico berro coletivo de “Morte à América” (pronuncia-se márg bár amriká) e os mesmos discursos habituais anti-EUA por parte de alguns clérigos e militares. Mas quem acompanha de perto o noticiário iraniano notou, por trás da aparente tensão de sempre, vários sinais apaziguadores vindos dos dois lados.
Primeiro foi o furo de reportagem do “New York Times” revelando a existência de encontros secretos entre Irã e EUA. O jornal cita fontes do governo Obama contando que essas conversas já resultaram em planos de negociações formais e diretas entre os dois arqui-inimigos. Todo mundo depois negou, mas após o desmentido fontes dos dois lados disseram que não enxergavam nenhum problema no princípio.
Em seguida, quando o furacão Sandy arrasou o nordeste dos EUA, o Crescente Vermelho do Irã, ligado ao regime, prontificou-se a mandar imediatamente socorristas e equipamentos para ajudar colegas americanos, que responderam com uma gentil carta de agradecimento, argumentando que estavam dando conta sozinhos e elogiando a expertise iraniana no amparo a vítimas de desastres naturais.
Na semana passada, agências de notícia internacionais relataram que o Irã estava disposto a parar de enriquecer urânio a 20% (nível de pureza que preocupa os inimigos) caso algumas sanções fossem levantadas. Um gesto amplamente visto como aceno apaziguador para favorecer Obama na eleição que viria dias depois.
Outro sinal de boa vontade partiu de um ex-embaixador do Irã em Paris e na ONU, que divulgou num site acadêmico um artigo de opinião elogiando o democrata, que alguns cidadãos iranianos curiosamente enxergam como um muçulmano que não pode se dar ao luxo de sair do armário por causa da população americana supostamente reacionária.
Para completar, no dia da eleição americana o todo-poderoso Ministério da Inteligência divulgou em seu site um comunicado de apoio implícito a Obama.
As reações pós-pleito aqui em Teerã foram discretas, mas os resmungos da vez são eloquentes. O chefe do Conselho de Direitos Humanos do Irã, Mohammed-Javad Larijani, disse que “conversas com os EUA não são tabu nem proibidas”. “Se for em nosso benefício, podemos conversar com a América até no fundo do inferno”, insistiu Larijani, um linha-dura membro da família mais poderosa do país, que tem três irmãos em altos cargos do regime. Um desses irmãos, Sadeq Larijani, chefe do Judiciário, foi mais cético e preferiu criticar Obama por não ter cumprido a promessa de abertura ao Irã feita no início do seu primeiro mandato.
Ou seja que Obama é melhor, sim, para o Irã – apesar de alguns analistas jurarem que uma vitória de Romney beneficiaria Teerã já que presidentes americanos com agendas externas muito agressivas correm o risco de alienar aliados europeus e reduzir o apoio a Washington, a exemplo do que aconteceu sob George W. Bush. E vamos combinar que o democrata marcaria um gol de placa se conseguisse algum desfecho pacífico para o dossiê iraniano.
De qualquer maneira, é preciso ser realista: Irã e EUA não estão nem perto da normalização ou até mesmo de um apaziguamento sincero e sustentável. Há muita desconfiança acumulada e qualquer concessão esbarraria em resistência interna. Um exemplo é o fato de as sanções americanas só poderem ser levantadas por votação no Congresso, que é esmagadoramente pró-Israel. No lado iraniano, especula-se que um dos mais céticos em relação a um possível acordo com Washington seja justamente o líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, detentor da palavra final em temas estratégicos do país.
O caminho, se caminho houver, é longo e incerto. E a janela para eventuais discussões é apertada, pois logo mais será a vez de o Irã entrar em campanha para a eleição presidencial, com voto marcado para 14 de junho. Não há até agora nenhum candidato declarado, mas um dos cotados é o pragmático ex-presidente e aiatolá Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, ao mesmo tempo líder religioso e empresário bilionário, que vem defendendo abertamente algum tipo de acordo com os EUA.
Um informe bastante consistente, digno mesmo de um repórter que não demonstra o mau hábito de muitos colegas de deixar pegadas subjetivas na explanação dos fatos. Concordo que a eleição do Obama, não é uma garantia absoluta no sentido de que não haveria uma intervenção militar por parte dos EUA ou de Israel contra o Irã. Contudo, acho difícil os EUA se meterem em outra enrascada militar antes de resolverem o imbróglio do Afeganistão e, também, antes de provarem que encontraram uma saída consistente para seus problemas internos, sobremodo os econômicos. Em relação a Israel não é fácil saber qual o grau de autonomia que teria para agir sozinho, já que qualquer movimentação militar naquela zona já conturbada, afetaria todo o contexto do espectro do petróleo com as naturais ondas de tensões em economias muito distantes do palco do possível conflito. Penso que a postura do diálogo, sempre interposto pela ONU, ainda seria o caminho mais civilizado e menos traumático.
Também sou a favor da Paz. Acho todo mundo tá também. Ainda mais depois da fraude da invasão do Iraque, aquele monte de mentira. Pra um país começar uma guerra de invasão contra outro, devia ter plebiscito obrigatório. E os filhos dos políticos deviam ser alistados compulsoriamente na infantaria do exército. Aliás, a família toda.
Excelente reportagem. Acho que Obama está certo de agir com muita prudência. Estamos cancados de guerra. Dialogo é a melhor opção.
E como você pode dialogar com uma pessoa que insanamente quer uma bomba atômica?
E como o senhor tem tanta convicção disso? Quais as tuas fontes? Possui algum contato no governo iraniano?
Sabe-se que o atual presidente do Irã é um parlapatão, que enrola, enrola, que só quer ganhar tempo até ter a bomba, e obviamente o Obama é mais “frouxo” que o Romney. Já explico o que quero dizer por “frouxo”.
Eu aposto que no Irã tomaram champanha depois do resultado, porque agora podem continuar enrolando mais um pouco, só que Israel não vai ficar quieto e vai encarar sozinho a ação, o Obama só vai entrar depois para dar apoio na retaguarda, o que dá praticamente na mesma, mas ele é mais esperto que o Mitt.
Aogra sobre o “frouxo”. Digo “frouxo” porque não põe a cara para bater logo, não assume a encrenca de cara, mas depois virá como uma patrola para cima do Irã sob a desculpa de proteger Israel, isso é inteligência.
Já o Miit não é frouxo, mas é burro, se o Mitt tivesse sido eleito o ataque à central nuclear e às instalações estratégicas não demoraria um mês, com graves descontentamentos internacionais contra ele e os EUA.