"What do you think about Iran?"
04/06/12 13:28Xenofobia é o medo daquele ou daquela que vem de fora, a rejeição de quem não é “como a gente”. O sentimento oposto, de amor ao estrangeiro, chama-se xenofilia. E os iranianos estão entre os povos mais xenófilos que já vi em anos de viagem pelo mundo.
Os mais receptivos e entusiasmados costumam ser os jovens. Quando percebem a presença de algum gringo na rua, é comum pedirem para tirar foto ou perguntarem qual o seu email ou contato no Facebook (barrado, mas usado em larga escala por meio de antifiltros). Alguns estrangeiros acabam até convidados para almoçar na casa de desconhecidos. A gentileza pode chegar ao ponto de ser embaraçosa para os padrões ocidentais. Mas o que os iranianos mais gostam é bater papo com quem é de fora. Tanto para praticar o inglês quanto para saber o que mundo pensa deles _ e quem sabe ajudar a melhorar a péssima imagem externa do país.
A conversa geralmente começa com o tradicional “welcome to Iran”, seguido da pergunta “what do you think about Iran?”, que pode ser declinada de outras maneiras, como “what is your opinion about Iran?”, “do you like Iran?” ou, em casos de inglês mais precário, “Iran good?”.
A interrogação reflete um sentimento contraditório amplamente difundido por aqui.
Por um lado, os iranianos são conscientes de que boa parte do mundo não gosta ou tem medo deles. Ressentem-se muito dos estereótipos negativos, que incluem um governo visto como fanático, supostos planos malignos para fabricar uma bomba atômica e relatos de apoio a grupos armados radicais no Oriente Médio.
Por outro lado, a população iraniana tende a ser ufanista e nacionalista ao extremo. Difícil achar alguém que não veja o Irã, de esplendor milenar, como uma das nações mais importantes e refinadas, mas cujo papel histórico e presente não é devidamente reconhecido. Iranianos se enxergam como parte do mundo rico e ficam ofendidos quando comparados a populações de outros países em desenvolvimento, árabes principalmente.
Ou seja, a pergunta sobre o que o estrangeiro, visitante ou residente, acha do Irã reflete uma profunda insegurança dos iranianos em relação à sua autopercepção como nação.
Vale a pena levar adiante a conversa. Quanto maior a troca, mais se aprende sobre o país e sua gente. O papo certamente desvendará a polarização extrema da sociedade.
Simpatizantes do governo, ou ao menos do sistema de governo em vigor, se esforçarão para explicar que o povo local é gentil e acolhedor. Dirão que a mídia ocidental mente, e que o Irã é um país moderno, desenvolvido e, à sua maneira, democrático. Citarão exemplos de campos onde a República Islâmica é bem sucedida (luta contra a miséria, educação, tecnologia, ciência etc) e apontarão, com razão, para a hipocrisia e política de dois pesos e duas medidas do Ocidente, que incomoda o país por seu programa nuclear enquanto fecha os olhos para Israel e Paquistão, detentores da bomba atômica e alheios a qualquer esforço de não proliferação nuclear. Em nome da pluralidade de perspectivas, acho válido ouvir até opiniões extremas, como a do tiozinho taxista que vibrou ao saber que eu era brasileiro (“país amigo”) para em seguida destilar o tradicional veneno do “morte aos EUA” e “morte a Israel”. Pura retórica. Praticamente não há registro de violência física por parte de cidadãos comuns contra estrangeiros no Irã. Além disso, as pessoas mais conservadoras e tradicionais muitas vezes são as mais generosas e acolhedoras, principalmente no interior do país.
Na outra ponta da sociedade, os iranianos mais liberais farão de tudo para convencer o gringo de que boa parte da população odeia o governo/regime e gostaria de viver ao modo ocidental. Estrangeiros, principalmente em Teerã, costumam ser convidados para festas privadas onde rolam bebida, drogas e pegação. Essa parcela da população, geralmente com renda mais alta e mais acesso a cultura, tem padrão de consumo parecido com o de americanos e europeus e vive querendo tirar férias ou estudar no exterior. Mas mesmo nesse meio, predomina a vontade de compartilhar o amor à pátria com os estrangeiros.
No fundo, os iranianos gostariam mesmo é que esse carinho com os estrangeiros fosse correspondido.
Samy, que bom que descobri seu blog. Finalmente uma visão do lado verdadeiro do Iran, pois o que vemos e lemos sobre o Iran é sempre veiculada e distorcida pela midia ocidental sediada em NY.
Imagino que os iranianos devam ser tão cordiais como os de outros 5 paises muçulmanos que visitei.
Pena que muita gente por aqui até hoje acha que o Iran é apenas mais um pais arabe. O fato é que não é árabe!
Samy , adoro ler seus artigos. Parabens por estar monstrando a realidade de um pais que quase o brasileiro nao conhece e o que conhecem e’ atraves da midia mediocre.
Carli, você insiste em falar da “ignorância” do povo brasileiro em relação à realidade do Irã e do Oriente Médio, conhecimento esse que somente seria disponibilizado, precariamente, através do que você chama de “mídia medíocre”.
Eu também sou parte desse “povo brasileiro” que você chama de ignorante e que só teria a tal “midia medíocre” como fonte de informação. Escute, não acho que somos tão ignorantes assim e nem que não temos oportunidade de acesso ao conhecimento. Não sei de que parte do Planeta você fala, mas quero lhe esclarecer que há por aqui literatura farta e disponível sobre qualquer país, cultura ou o que mais houver acerca de qualquer povo ou nação do mundo. Não estamos num canto escuro do Planeta, assim tão desprovidos como você imagina.
É possível que você esteja num lugar longe daqui, onde possa nadar livre nas luzes do conhecimento, entretanto visistou-nos aqui neste blog e então pode ver por si próprio(a) uma bela mostra do muito que temos.
Ola Samy seu texto e suas reflexões sao demais. parabéns. o ira no Brasil é mto mal visto as noticias são unicamente de bomba atomica.
Parabéns Samy!
É com corujice que leio teus relatos e opiniões. É fantástico acompanharmos esta desmistificação de um povo com tanta propriedade. Vá em frente…
Porque será que o Irã tem péssima imagem no exterior? Que coisa mais injusta???
Vejam um dos posts anteriores intitulado “Polícia Moral” já responde.
Não podemos confundir as coisas, cada um tem o direito de ser religioso o quanto quiser, ou conservador na medida que achar ideal…mas impor o seu parâmetro para os outros? Isso é o quê? intolerância, arbítrio, abuso de poder do Estado contra o cidadão indefeso.
É claro que não podemos julgar outros povos com base em nossos parâmetros, mas eu pergunto tratar as mulheres como se não fossem cidadãs está certo? Querer impor seus parâmetros religiosos mesmo para estrangeiros está certo? Façam me o favor! Este país está vários séculos atrasado!
O Irã está séculos a frente da Árabia Saudita, aliada americana da qual não se profere uma palavra sequer de condenação contra as violações dos direitos humanos e direitos da mulher.
*Isso que eu sentia na Turquia.
Em relação as festas, é bem como você disse!
É exatamente assim que me sentia na Turquia! Fiz meu intercâmbio lá. Essa receptividade, amistosidade, parecer ser característico dos países do Oriente Médio, povos árabes e afins, como são os Iranianos, Turcos e demais…
Sinto muita falta da Turquia, e esse espaço serve de consolo hehehe, enxergo bastante semelhanças entre turcos e iranianos. Isso de querer passar uma boa imagem do país (a Turquia está um pouco melhor que o Irã nesse aspecto), receber bem quem é de fora, tudo muito parecido. Na Turquia eles enlouqueciam quando encontravam brasileiros, são loucos por futebol! Agora além de voltar pra Turquia, quero muito conhecer o Irã.
Continue postando com regularidade!!!
Parabéns Samy! Você realmente escreve muito bem; não apenas na forma, mas na essência. É sempre um prazer ler seus posts, especialmente para aqueles que não confundem o governo do Irã com o povo e a terra do antigo império persa.
Fico imaginando como um jovem brasileiro como você, antenado, culto, sensível, convive com as restrições sociais e culturais. Bem?
O caso é medo mesmo.
Notícias de que “fulano” diz ser turista, mas foi preso por espionagem, diminui o entusiamo de muita gente que está afim de visitar o Irã.
Outro detalhe é a polícia moral e guarda revolucionária. As pessoas têm medo de incorrer em erro por desconhecer algum aspecto das leis locais e entrar numa tremenda roubada com consequências inimagináveis.
Sem falar no discurso contra os costumes ocidentais. Se são contra os costumes …
Por essas e outras é que as pessoas preferem fazer turismo no Brasil, mesmo com o risco de serem assaltadas e baleadas, o que não é raro.
É isso aí !
Questão de simpatia com o mundo.
Sr. Bartolomeu, não me lembro de notícias sobre turistas presos por acusação de espionagem, exceto de três estadunidenses que teriam cruzado, involuntariamente, a fronteira com o Iraque e entrado em território do Irã.
*
É verdade: convém sempre em viagens ao exterior consultar as orientações das agências de turismo, relativamente aos costumes locais. A polícia de costumes é constituída informalmente por “basijs” antipáticos, mas discretos, e pelos furgões policiais de cor verde, acompanhados de uma viatura. Estes são ostensivos e geralmente comandados por mulheres (vi algumas e fotografei de longe) com cara de “madre superiora”. No entanto, pelas informações que obtive e também pelas situações concretas que presenciei, elas dão orientação verbal e fica nisso mesmo: a mulher ajeita o lenço, o rapaz se afasta um pouco da garota etc. Com estrangeiros são particularmente compreensivos, até pela cordialidade que o Samy tão bem descreve nesse artigo, mas também para evitar problemas internacionais, já que o país é particularmente visado. Aliás, aos casais estrangeiros não se exige a certidão de casamento para ocuparem o mesmo quarto de hotel. Curiosamente, outro dia, li que o maio de 1968 em Paris começou porque se proibia os rapazes de dormirem nos alojamentos das moças.
*
Se puder, vá conhecer o Irã. Não vai se arrepender e terá uma visão maravilhosa de um país encantador. No meu caso, andei quase todo o tempo com um crucifico, a pedido de um amigo, e não houve um momento sequer de qualquer forma de discriminação ou desrespeito, mal trato. Pretendo voltar, para conhecer Tabriz, no Azerbaijão iraniano e o Golfo Pérsico e passear pelos parques à meia-noite, vendo casais e famílias fazendo piqueniques, sem risco de assalto.
Nobre colega.
O caso é que, o Irã construiu ao longo das últimas décadas, uma imagem como a de uma ostra carrancuda e anti-ocidente.
Houve eleições livres e o povo não optou por mudanças. Que pensar ?
Essa preocupação por parte da população, em saber o que o mundo pensa à seu respeito, é bem sugestiva.
Indica que eles querem se dar à conhecer, sem saber bem como. Querem interagir. Querem desconstruir a imagem de ostra, sem que para isso percam qualquer coisa de sua cultura e/ou identidade.
Parece haver muita simpatia e cordialidade no Irã. Mas está presa dentro de suas fronteiras.
O Irã precisa sair e mostrar sua cara.
Caro Bartolomeu, esta imagem que cita não foi criada pelo Iran, e sim pelo próprio ocidente (leia-se EUA e Europa ocidental).
E’ isso ai Marcelo. acabei de escrever isso tambem.Bravo, mais um lucido ,estamos caminhando.
Senão vejamos.
No Irã a internet não é livre porque o governo impõe filtro contra conteúdo ocidental. Isso não foi votado em Washington, portanto não é culpa dos americanos. Dia desses foi noticiado neste jornal, a proibição de cortes de cabelo à moda ocidental e a comemoração do dia dos namorados.
São coisas sem grande importância e que realmente não pertencem à cultura daquele país, mas envia uma mensagem clara de desprezo e necessidade de afastamento dos nossos modos e consequentemente de nós ocidentais.
Por outro lado, não foi votado em Washington, qualquer lei proibindo o acesso a conteúdo iraniano bem como a costumes daquele país. Coisa que passou despercebida pela lúcida Carli.
Na verdade nao foi o Ira que contruiu sua imagem , assim como voce disse, e sim , foi feita a imagem do Ira , atraves da propaganda enganosa. Quem disse que o Ira nao mudou ?? Mudou e muito , as mulheres tem cadeira no parlamento , trabalham e tem vida ativa. Ha’ problemas como todos os paises , mas a propaganda enganosa torna isso como um cancer. Moro no Oriente Medio e nao vejo o Ira como uma ameaca , muito pelo contrario.
Infelizmente o povo brasileiro , e’ muito ignorante sobre Oriente Medio ,isso e’ um excelente alvo p/ a propaganda enganosa.
Por que “o povo brasileiro”? O mundo todo é ignorante sobre o Irã assim como sobre uma série de outros países e povos. A maioria de nós mal sabe sobre seu próprio país. Achar que sabe o que de fato não sabe é um grande problema em toda parte, e fazer julgamento sobre o que acha que sabe chama-se preconceito. É disso que o todo o mundo está cheio até as tampas e do que poucos se dão conta e seguem dandos seus pitacos aqui e ali. A meu ver, o Irã e seu povo são um país e um povo mais do que normal. Têm cultura própria, leis próprias e um regime que chamam de democracia, como aqui e em toda parte. Como a democracia é um sistema dinâmico que inclui aprendizado e crescimento, é aí que estão, como nós ou qualquer outro povo, aprendendo e, eventualmente, crescendo. Não são melhores e nem piores do que ninguém.
Caro Bartolomeu
As coisas por aqui são mais complexas que o pouco que aparece na televisão e nos jornais. Lembre-se que a mídia precisa vender notícias e nada melhor que pegar coisas pontuais e fazer um mega drama. Moro aqui há pouco mais de um ano e garanto não existir qualquer problema de segurança. Não há violência. Não há assaltos. Sou muito melhor tratada aqui que na maioria dos países Europeus e Árabes.
Quanto as “eleições livres” que você citou, provavelmente não sabes que os candidatos são pré-aprovados pelo líder supremo (religioso islâmico). Neste caso, dificilmente o povo têm a oportunidade de escolher um liberal, pois ele não é aprovado como candidato. Como o voto não é obrigatório por aqui, quem quer mudança nem vai votar em sinal de protesto. O resultado na prática é um percentual baixo de votantes, o que já sugere uma insatisfação das pessoas e a vontade de separar política de religião.
Outra questão importante a destacar é que o povo é muito pacífico. Sofreu demais na guera Irã x Iraque (guerra esta que eles não começaram), que durou de 1980 a 1988. Todos perderam parentes e amigos na guerra. É um sofrimento ainda presente e que dificulta qualquer tentativa de protesto por mudanças.
Meus amigos iranianos acreditam na mudança gradual, coisa que já vem acontecendo nos últimos 10 anos. Maquiagem, roupas coloridas e mais apertadas, cabelos pintados e mechas à mostra já são comuns por aqui, coisa que no início da revolução islâmica era impensado! Marcas internacionais estão presentes por todos os lados (Coca-cola, Pepsi, Nike, Adidas, Samsung, LG, etc, etc). E internet, apesar de bloqueada parcialmente, é de acesso a todos através dos anti-filtros.
Com uma população atual de 70% abaixo dos 30 anos, será difícil conter tanta vontade de liberdade nos próximos anos. Será uma questão a ser decidida pelos dirigentes: liberalizar ou perder definitivamente a popularidade…
Saudações da Pérsia!
Com certeza há um certo preconceito em relação ao Irã em grande parte da mídia internacional. O problema maior realmente é a retórica dos que governam e controlam a população de ambos os lados. O povo iraniano é gentil para com o extrangeiro assim como como o brasileiro tbm o é.
Exatamente tudo isso que vc falou….
Parabéns Samy.
Você faz um favor a todos ao desmistificar o Irã.
O povo iraniano certamente o agradeceria se soubesse o que você faz.
Olá, Samy. Gosto muito dos seus textos, especialmente porque você aborda – e nos mostra – a sociedade iraniana, tão diferente da nossa, de um modo que geralmente não é o que vemos em outros veículos da mídia. Parabéns pelo seu trabalho e obrigada por trazer essa perspectiva aos seus leitores.
Samy, que texto maravilhoso. Você descreveu exatamente o que senti nos meus quinze dias de viagem no Irã. Eu não conseguiria dizer melhor do grau de cordialidade do povo persa.
Prezado Sammy, parabéns pelo seus textos, me interesso muito por eles, gosto dos assuntos abordados.
Gostaria de saber se é verdade que o Irã terá uma internet somente utilizada por eles, além disso se o acesso ao provedores g-mail, yahoo e outros estão bloqueados.
Muito obrigada, e mais uma vez gosto muito do seu trabalho.
Obrigado, Letícia. Não é de hoje que as autoridades iranianas ameaçam sair da internet mundial e criar a própria rede interna, com conteúdo “lícito”. Mas um alto funcionário do governo já deixou claro que isso não vai acontecer. Tendo a achar que eles não vão mesmo fazer isso. Contas Gmail, Yahoo, Hotmail etc. funcionam normalmente.