Os persas e seus nomes poéticos
01/03/12 12:24Poesia é coisa séria no Irã. Quase todo mundo sabe de cor um monte de versos, rodas de amigos adoram debater autores e um dos principais ícones nacionais é o poeta Hafez (1310-1390), cujo túmulo em Shiraz atrai romaria do país inteiro. Hafez, aliás, era crente e capaz de recitar o Corão inteiro, mas celebrou em sua obra a embriaguez e o amor.
O gosto pela poesia parece ser um traço milenar da cultura persa, e até hoje pais dão aos filhos nomes, ou prenomes para ser mais exato, que são pura metáfora. Uns são bucólicos, outros românticos. Há também os metafísicos. É exemplo pra todo lado.
Tenho uma amiga que se chama Yeganeh (única no mundo). A irmã dela é Taraneh (canção). A chefe da agência Reuters no Irã leva o prenome de Parisa (aquela que é como uma fada). O da iraniana mais famosa do planeta, a ativista de direitos humanos e Nobel da Paz Shirin Ebadi, significa “doce”. Não confundir com “açúcar”, ou Paníz, em farsi, como é chamada minha assistente. Simin, personagem principal do badalado e premiado filme “A Separação”, quer dizer “aquela que brilha como prata”.
Homens também levam prenomes na mesma linha. Meu cabeleireiro é Behrooz (dia feliz), e o recepcionista do hotel onde fiquei ao chegar, Navid (boa notícia). Um tempo atrás entrevistei um cantor que se chama Omid (esperança). Conheço um sujeito que é Payam (mensageiro).
Ouvi vários outros nomes poéticos. Meus preferidos são Kohinoor (montanha de luz), Shahin (falcão peregrino) e Parastoo (andorinha).
Mas já repararam que os nomes dos governantes iranianos geralmente não seguem esse padrão? O presidente é Mahmoud [Ahmadinejad]. O líder supremo chama-se Ali [Khamenei], assim como o chanceler [Akbar Salehi] e o poderoso chefe do Parlamento [Larijani]. O Ministro da Defesa chama-se Ahmad [Vahidi] e o primeiro vice-presidente, Mohammad [Reza Rahimi].
Esses são nomes muçulmanos de origem árabe, comuns em famílias mais religiosas e, portanto, mais propensas a endossar o regime teocrático. Afinal, a influência árabe na Pérsia veio com a disseminação do islã, surgido onde é hoje a Arábia Saudita, lá pelos séculos 7, 8 e 9. Antes disso os persas eram essencialmente zoroastras, judeus e cristãos _hoje minorias.
Belo texto, Samy! Leve, conciso, claro e informativo pra nós, que estamos do outro lado desse mundo.
Completou o meu conhecimento, parabêns.
A vibração das palavras, a vibração das intenções, a vibração dos sentimentos, a vibração das ações.
Fico muito feliz de ter a oportunidade de conhecer um pouco mais da cultura iraniana a partir de um olhar de dentro. Tive a oportunidade de viver na Inglaterra e na França, nos anos 80, quando tive muitos amigos estudantes iranianos. Lembro deles com saudades. Apesar das diferenças culturais e políticas, prevalecia a dimensão humana da amizade.
Continuo tentando aprender um pouco do Irã, e sou especialmente admiradora do seu cinema, que compartilho com meus alunos.
Independentemente das questões políticas e dos direitos humanos (problema, infelizmente, não só do Irã), trata se de uma bela cultura, cujo aprendizado só nos enriquece.
Acompanharei com carinho a coluna.
(lembro de alguns nomes de colegas: Nosrat, Shady. Tem tradução?)
Eliane, no Google você pode achar sites especializados em nomes persas, com significado e origem.
Cara Eliane, eu encontrei pesquisei por curiosidade o significado destes nomes:
Shady significa felicidade e Nosrat significa vitória.
para JOSE HENRIQUE – O SEU comentário é muito inocente. Achar que o filme iraniano reflete a realidade do país, precisa viajar amigo, nao ‘vá ao Irã que voce poderá ser preso. Vá aos EUA para ver que filmes não refletem a realidade, são iguais às novelas da Globo, só para iludir o telespectador. o Irã que eu vi nao tem nada a ver com o tal filme. Em filme se coloca tudo o que o diretor imaginar. Não sabia?
Muito interessante.
Inclusive a relação entre nomes árabes e a alta cúpula política/administrativa.
Acá tambem ha nomes interessantes, porem nada poéticos.
Conheci um sujeito que tinha nada menos que 12 prenomes de origem africana, seguido pelo sobrenome “da Silva”.
Não perguntei nada ao contemplado com tantos nomes, pois ao terminar de ler seu nome, mirei sua face, e a expressão dele dizia; ” preferia me chamar Zé”.
Outro nome que me chamou à atenção foi “Carabino Tirocerto”. Talvez o “poeta” que lhe deu tal nome tivesse algum desejo inconciênte de que este se tornasse cangaçeiro.
No norte e nordeste o povo gosta de juntar prenomes para criar novos prenomes com resultados catastróficos !
Pensando bem, a diferença entre Brasil e Irã é gritante !
Há iranianos com nomes que passariam por hindus, ouvindo-se a música persa original tem-se a impressão de que lá há uma cítara acompanhada de flautas e percussão com tambores típicos. É claro que os dois países tem um vasto território e as regiões próximas são influenciadas, historicamente a Índia herdou sua cultura a partir da Pérsia o que talvez justifique haverem tantos traços de semelhança maiores do que a cultura árabe-islâmica.
Texto adorável. Pelo que tenho lido, no Irã há muitos parques e áreas verdes, as pessoas fazem piquiniques em família e oferecem quitutes aos passantes, como se faz aqui no Brasil com o chimarrão. O filme “A Separação” mostra “en passant” essas áreas verdes, sem contudo omitir o trânsito caótico de Teheran. Gostaria de saber mais sobre esses jardins persas.
Aliás, uma das coisas que me chamou a atenção neste filme sensacional foi o pai do protagonista, com Alzheimer, após sair da casa da nora, usar uma gravata. Parece que a gravata não é bem vista pelo governo do país. Nunca vejo o presidente Ahmadinejad com gravata, ou os demais ministros de Estado.
Gostaria também de saber se as minorias religiosas detêm direito de Nacionalidade iraniana e de Cidadania, ou se são privados desses direitos reconhecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, como os Palestinos na Cisjordânia ocupada. Outra curiosidade é comparar o número de sentenças de morte efetivamente aplicadas no Irã, na Arábia Saudita e nos EUA.
Talvez imperceptível aos próprios iranianos, afinal do meio das árvores não se vê a floresta, a influência da India e sua cultura sobre o Irã é colossal, talvez seja isso que cause o destaque desse país sobre os demais países além do fato de serem persas. A influência na dança, música, poesia e organização social é notável para quem observa de longe. O clima predispõe aos extremos tanto no amor como na guerra, tanto na índia quanto no Irã.
sugiro esta leitura sobre judeus persas (em inglês) http://en.wikipedia.org/wiki/Persian_Jews
Também tenho admiração pela antiga, que não existe mais, Persa. A dúvida é: como pode um povo tão rico e inteligente admitir viver sobre a ditadura religiosa onde mata quem levanta um dedo de discórdia, inclusive de outras religiões, gays, mulheres etc. Isso não dá para entender. Não adiante desenterrar Hafez em um cenário de alucinação e violência, inclusive ameaça nuclear.
Belíssimo texto. Parabéns. Os nomes orientais costumam ter significados interessantes. Em Israel, por exemplo, Davi significa “Amado”. Meu próprio nome foi retirado da Bíblia por minha mãe e “afeminado”, de Daniel para Daniela. Significa “Deus é meu Juiz”
Fiz uma amiga chamada Saman, que aí no Irã é nome masculino, e a guria soooofre a vida inteira para explicar que — apesar da escolha pouco feliz dos pais — é 100% menina…
Parabéns Samy, continue com seu blog… é disso que precisamos, amor… muito amor…. estamos cansados de ouvir o lado ruim de tudo e de todos… vamos celebrar a cultura… a vida!
Olá Samy, só para finalidade de contribuir faltou mencionar que a fonte de muitos desses nomes do povo iraniano é o famoso épico “Shahnameh” (O Livro dos Reis) escrito pelo poeta Firdusi no século X. E dentre os nomes islâmicos citados, alguns tem uma ocorrência maior como Mohammed, Reza, Ali, Hossein e entre as mulheres Fatemeh, Maryam … mas no fundo estes nomes também são bem poéticos, pois na minha opinião o Alcorão, escrito em árabe também é uma maravilhosa obra poética. Também tenho outra curiosidade, o cantor que você entrevistou por acaso é o famoso Omid Soltani?
Janaina, o cantor entrevistado não era tão famoso. Tratava-se de um personagem cujas declarações usei numa reportagem sobre música clandestina em Teerã. Foi publicada na Folha impressa há algumas semanas.
lindo, lindo!
UÉ, NO IRÃ EXISTE JUDEUS? POXA VIDA, COMO SÃO AS COISAS. PARECE QUE O ÓDIO RELIGIOSO ESTÁ MAIS PARA OS GOVERNANTES(ISRAELENSES) DO QUE DO POVO IRANIANO.parabens pelo blog.
A pópulação judia do Iran conta com mais de dois mil anos. Aliás, por volta do ano 1000 em certas cidades havia mais judeus do que persas de origem e que teve novo encremento com a a expulsõdestes pelos da penísula ibérica pelos reis católicos em 1492.
Os iranis também tem uma bela relação com as flores, com uma festa nacional no campo, se não me falha a memória… o Sr. Adghirni deve conhecer esse outro lado poético. Paradoxos da alma humana….
De fato, Carlos, iranianos adoram flores, há floriculturas em cada esquina de Teerã.
Mas se repara bem aqui no ocidente, os nomes também têm significados poéticos.
newton, só para descontrais, tinha, acredito que continua tendo, uma pessoa que se chamava: Um Dois Três de Oliveira Quatro.
Certamente a intenção da matéria foi mostrar aspectos não-teratológicos do povo irani, o que é louvável diante da pletora de matérias sobre o caráter brutal do regime que substituiu o igualmente brutal regime do Xá. Mas não vi, em nenhuma mídia tupiniquim a cobertura da condenação à morte por enforcamento do Pastor cristão Nadarkhani. Gostaria de ler algo à respeito. Parece que o regime mudou as acusações de apostazia para estupro e ações rebeldes. É isso mesmo ?
Carlos, escrevi matéria detalhada sobre o caso, foi publicada na edição de ontem da Folha, versão impressa. O Irã disse ao governo brasileiro que o pastor não será executado e que a pena capital por apostasia jamais foi aplicada.
Tomara, então, que ele seja libertado logo, já que, pelo que se diz na mídia internacional, é casado e pai de dois filhos. No mais, a informação da condenação à morte por apostazia é encontrada no site da Anistia Internacional, organismo, pelo que sei, isento de cores políticas. O mesmo organismo informa que em setembro de 2011, cerca 60 derviches (sufis) foram presos sem acesso de advogados ou familiares. Já a perseguição dos Baha’i mereceria todo um livro, infelizmente.
O senhor articulista também poderia nos contar como é a perseguição dos que professam a fé Bahai, uma das mais belas do mundo… cujo ecumenismo é um dos seus princípios maiores. Pudera serem tão perseguidos…
Também o articulista poderia nos contar que as mulhres não podem se divorciar dos seus maridos sem autorização destes, nem viajar, trabalhar, ou levar uma vida normal sem tais outorgas maritais…. mas fiquemos na perfumaria, senhor articulista, que decerto a lenda das 72 virgens para os homens-bomba não existe por aí…
Carlos, bom dia. Concordo com você a respeito das mulheres não terem a liberdade (que nós achamos normal), lá é milenar esses acontecimentos, será que se fosse ao contrário, nós concordaríamos?
Naturalmente alguns lembrarão de que aqui também há mulheres condenadas à morte. A diferença é que a força bruta contra elas é uma política oficial de Estado, aliás, o mesmo Estado que se recusa a assinar integralmente a declaração universal dos direitos do homem, sob o argumento de que alguns deles, notadamente a liberdade religiosa, sexual, de informação, entre outras, são contrários ao Islã. Então os néscios se valem do relativismo cultural para chancelar essa belíssima cultura. Aliás, não posso confundir o povo e o país com o brutal regime que o governa. Minhas excusas….
Não se esqueça que a declaração universal dos direitos do homem é de 1948 e a revolução islâmica é de 1979.
“Esses são nomes muçulmanos de origem árabe, comuns em famílias mais religiosas e, portanto, mais propensas a endossar o regime teocrático. Afinal, a influência árabe na Pérsia veio com a disseminação do islã, surgido onde é hoje a Arábia Saudita, lá pelos séculos 7, 8 e 9. Antes disso os persas eram essencialmente zoroastras, judeus e cristãos _hoje minorias.”
Você começou bem, muito poético mas estragou seu texto no final, políticos, em sua maioria são todos iguais, são egoístas, mas seu texto dá a entender que o islamismo(a religião) estragou os persas.
O que você quis dizer afinal?
Precisamos de paz nesse mundo e os iranianos de qualquer religião merecem nosso valor pela cultura e herança que têm.
Valeria, é evidente que eu não disse isso. Em momento algum fiz ou insinuei juízo de valores. Apenas relatei que o islã trouxe nomes diferentes à sociedade persa. E os problemas que aqui existem decorrem da política, não da religião como fé e espiritualidade.
Não se pode esquecer da condenação de “adúlteras” ao apedrejamento… tudo em nome de “Deus”, naturalmente, um “Deus” muito diferente do nosso, por certo….
Em nome de deus tambem matamos, só que gostamos de criticar outros. Dentre milhares de casos, vou citar a morte de uma Yalorixá aqui em salvador pelos praticantes de uma seita evangelica conhecida. Nem pedra foi usada, invadiram o terreiro e “pimba”. Tudo em nome de deus, fazemos o mesmo, apenas com praticas diferentes.
Talvez o “articulista” pudesse relatar como são os enforcamentos no Irã: antes de matar, propriamente, o regime tortura o condenado por enforcamento lento por gravidade – onde o enforcado demorará mais de meia hora para morrer – ou por garrote, como fizeram com a garota de 16 anos que fora estuprada, Atefah, por “crimes contra a castidade”, isto é, ser estuprada reiteradamente por um guarda revolucionário.
Carlos, suas críticas devem ser direcionadas ao regime, não à população.
Falha nossa. Já reconheci e reconheço. A população tem uma cultura interessante e multi-milenar. Estás inteiramente correto.
Samy, a população fez, sustenta e escolheu o regime. são tambem culpados.
Aqui a gente elege o Tiririca…
É lamentável que você esteja no Irã e tem a vista tão curta, não consiga ver a realidade do país, que eu conheço. Deve estar muito bem assessorado pelo regime ditador.
Andreas, sem ataques pessoais, por favor. Um regime complicado não significa que não se possa ver outras coisas no país. A cultura persa e iraniana é milenar, riquíssima e sofisticada.
Parabéns pelo Blog. Realmente é muito bom conhecer detalhes de uma cultura diferente como essa. Gostaria de sugerir um tema para você abordar: Custo de Vida. Qual o preço das coisas e se possível comparar com o Brasil. Tipo: Alimentação, Combustível, Carro, Casa, Aluguel e etc…
Pena que essa ”belíssima” e ”poética” cultura enforque cristãos, homossexuais, oposicionistas e moças estupradas (por sedução….).
Aqui a gente faz isso com negro, homossexuais e pobres na periferia, e nem julgamento tem. É corpo na vala, lei das milicias ! Cada país com seu modo de viver.
Fato Valdir!
tenho pela arte, cultura e história
da pérsia uma carinho forte
e inexplicável.
conhecer Rumi, foi como renascer.
Mas uma belíssima amostra de uma cultura distinta da ocidental. Belo texto.
De fato! Muito interessante.